475 - HILÁRIO

Aos 14 anos de idade o Atlético de Lourenço Marques vai buscá-lo às fileiras do emblema de bairro, FC Arsenal. Por esta altura, o menino Hilário, de origens muito humildes, mal tinha visto um par de sapatos na sua vida, quanto mais conseguir jogar de chuteiras. A solução foi passar dois anos a adaptar-se ao uso de calçado... jogando de sapatilhas e na prática do basquetebol!!! Findo este período, dá-se a sua estreia no futebol do emblema da capital moçambicana. Já na modalidade certa, ainda assim, para Hilário faltavam acertar algumas arestas na sua definição como jogador de futebol. Habilidade não lhe faltava, mas quando umas vezes, entre outras posições, se joga no meio campo, outras no centro da defesa e outras, ainda, na direita do sector mais recuado, há sempre algo que fica por aprender.
Este dito acerto aconteceria já em Lisboa, ao serviço do Sporting, e quando os responsáveis pela equipa decidiram que ele haveria de ser o substituto do internacional Joaquim Pacheco. Logo na temporada em que chegou a Portugal, 1958/59, Hilário mostrou os seus dotes de futebolista. Veloz, de reflexos rápidos e de uma bravura excepcional na disputas dos lances, o, agora em definitivo, lateral esquerdo, já prometia vir a ser um sucesso dentro do plantel leonino. Foi muito mais do que isso! Hilário, nas 15 temporadas que passou de "Leão" ao peito, acabaria por se tornar, não só num dos maiores símbolos do clube, como num dos melhores da sua posição, na história do futebol português. Para provar esta justa distinção, bastariam os números de que foi feita a sua carreira. Contudo, nada há melhor do que as palavras de um dos seus pares, José Augusto, e por sinal um dos seus maiores rívais dentro de campo, para ilustrar aquilo que acabei de afirmar - "O Hilário foi o defesa-esquerdo que melhor se adaptou à minha maneira de jogar. Era muito forte a manter posição e recuperava com muita facilidade (...). O Hilário, de quem continuei amigo pela vida fora e ao lado de quem vivi a epopeia dos Magriços, foi o adversário mais difícil que apanhei pela frente - mais ainda que o alemão Schnellinger e o italiano Facchetti(...)"*.
No entanto, nem tudo foi um mar de rosas para o antigo internacional português. Um dos episódios mais desgostosos da sua carreira prende-se, ironicamente, com um dos momentos mais gloriosos do seu Sporting. Parece impossível?! Mas é fácil de explicar. Ora, uns dias antes da partida para a Bélgica, onde se iria disputar a última etapa da Taça dos Vencedores das Taças de 1964, o Sporting haveria de defrontar o Vitória de Setúbal. Num lance fortuito, o choque entre Hilário e José Maria, resulta na lesão do atleta leonino. O pior prognóstico confirmar-se-ia, com Hilário a ser retirado da convocatória para a final frente ao MTK de Budapeste, devido à fractura que havia contraído na perna direita. Apesar de afastado desses dois desafios (final e finalíssima) que deram a vitória aos "Leões", Hilário viu reconhecido toda a sua paixão, quando os seus colegas o visitaram no recobro e lhe deram a beijar o troféu conquistado.
Outro dos momentos altos da sua carreira e que lhe valeu a consagração internacional da sua carreira, foi o Mundial de 1966. Em Inglaterra, Hilário, muito para além de ter sido uma das pedras fundamentais no 3º lugar de Portugal, acabaria, pelas suas fenomenais exibições, por ser considerado como o melhor defesa esquerdo da competição e, por acréscimo, um dos melhores do mundo da altura no cumprimento de tais funções.


* retirado de "Os 100 magníficos", por Rui Dias

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