901 - JESUS CORREIA

Ainda antes de chegar ao mais alto nível, já Jesus Correia dividia a sua existência entre duas paixões. Futebol e hóquei em patins eram as modalidades que prendiam a sua atenção. Ao mesmo tempo que brilhava como patinador do Paço de Arcos, também noutras associações daquela localidade jogava à bola. Foi então que um ultimato fê-lo optar pela disciplina dos ringues. Contudo, o jovem praticante jamais esqueceria esse segundo amor e anos mais tarde, no Belenenses, haveria tentar a sua sorte. Curiosamente, dizem que por conta da sua tenra idade, seria recusado. Augusto Silva, antiga estrela da “Cruz de Cristo”, dir-lhe-ia para voltar no ano seguinte. Tarde demais. O atacante não regressaria às Salésias e quem acabaria por ganhar com tudo isso seria outro dos “grandes” de Lisboa.
Quem não o deixaria escapar seria Joseph Szabo. Avisado para o seu excelente potencial, o treinador do Sporting faria tudo para o juntar ao plantel leonino. Claro está que havia ainda a questão do vínculo ao Paço de Arcos. Apesar da relutância em libertar o atleta, a pressão para que tal acontecesse, levaria a que o emblema da “Linha de Cascais” convocasse uma assembleia para deliberar sobre o assunto. É então que tudo fica decidido e, em paralelo com o hóquei, Jesus Correia passa a representar o futebol “Verde e Branco”.
Em Alvalade não demoraria muito até que o jogador conseguisse afirmar-se como um dos elementos mais importantes do conjunto. Com velocidade, excelente técnica e uma, igualmente boa, capacidade finalizadora, Jesus Correia tanto servia para o eixo do ataque, como na extrema-direita do campo. Logo na segunda campanha, com Peyroteo a ocupar a posição de ponta-de-lança, conseguiria um lugar na ala destra dos afamados “Cinco Violinos”. Ainda antes de conquistar a titularidade, sendo suplente de Adolfo Mourão, o atacante começaria a juntar os primeiros títulos ao seu palmarés. Aliás, durante as 10 temporadas que passaria de “Leão” ao peito, os troféus seriam uma constante. Campeão Nacional por 7 vezes, juntaria ainda ao seu currículo 2 Taças de Portugal e 2 “Regionais” de Lisboa.
Também no Hóquei o seu sucesso foi incrível. Pertencendo a uma das melhores equipas de sempre do Paço de Arcos, Jesus Correia começaria por amealhar diversos títulos nacionais. Pela selecção o seu êxito ainda foi maior. Para além dos títulos europeus, o atleta ajudaria Portugal a conquistar 6 Campeonatos do Mundo. Aliás, seria na antevisão de um desses certames que estalaria a guerra entra as duas federações em que estava inscrito. Com mais um torneio à vista, a Federação Portuguesa de Patinagem pede à Direcção Geral dos Desportos para que cancelasse a sua licença de futebolista. O pedido é recusado. Todavia, a contenda faz com que o Sporting exija ao jogador a sua exclusividade. O que ninguém da direcção leonina devia estar à espera, é que o atleta escolhesse a modalidade dos ringues. Assim foi e, sem completar 30 anos de idade, o avançado deixa o futebol.
Apesar do abandono precoce na temporada de 1952/53, o legado deixado por Jesus Correia foi enorme. Para a memória ficarão os 6 remates certeiros conseguidos frente ao Atlético de Madrid, em plena capital espanhola. Também no plano nacional, os seus golos seriam de enorme importância. Com a camisola do Sporting conseguiria, só em partidas oficiais, concretizar mais de 150. Um deles, no entanto, haveria de o lançar para o coração de todos os sportinguintas. Numa altura em que ainda procurava cimentar o seu lugar na equipa, o golo conseguido na final da Taça de Portugal de 1944/45 elevá-lo-ia à condição de estrela do clube.
Alguns anos mais tarde ainda voltaria a envergar as cores de outro emblema. Na temporada de 1955/56, pela CUF do Barreiro, Jesus Correia ainda faria algumas partidas. Contudo, a verdade é que o Hóquei era sua maior paixão. Na modalidade ainda abraçaria as tarefas de treinador. Nessas funções e comandando o seleccionado português, conseguiria juntar ao seu já rico palmarés, mais 2 títulos de Campeão Mundial.

900 - MAX WOOSNAM

Ainda nos tempos de escola, começaria por destacar-se como um desportista versátil. Apesar de praticar diversas modalidades, em todas elas o jovem praticante parecia conseguir destacar-se. Tanto no ténis, como no golfe, cricket ou futebol Max Woosnam excedia-se em cada partida jogada. Já como aluno da Universidade de Cambridge, sempre dentro do contexto escolar, as distinções continuariam a fazer parte da sua vida.
Com o fim dos estudos, o defesa central decide alistar-se numa equipa. Vendo no desporto amador uma virtude, o Corinthian, popular conjunto londrino, acabaria por ser a sua escolha. Logo no ano da estreia, é incluído numa digressão que o levaria ao Brasil. Tanto a enfrentar equipas do Rio de Janeiro como de São Paulo, as suas exibições seriam alvo de destacados louvores. Sensivelmente um ano depois, e já em plena viagem para a América do Sul, rebenta a 1ª Grande Guerra. Decidindo que o dever de ajudar o país era superior a qualquer interesse desportivo, todos os elementos do conjunto resolveriam cancelar a nova tournée, regressar ao Reino Unido e alistar-se no exército.
Durante a Guerra, Max Woosnam seria destacado para diferentes frentes. Tanto na Turquia, quanto em França, o desporto não seria esquecido. Esses desafios serviriam para alimentar a paixão que, terminados os conflitos bélicos, voltariam à sua rotina. Regressado a Inglaterra é o ténis e o futebol que mais preencheriam os seus dias. Tendo, antes do conflito mundial, feito algumas partidas pelo clube, é com as cores do Chelsea que dá continuidade à sua carreira. Ao mesmo tempo, os “courts” passam a ter um grande peso no seu percurso competitivo. Aliás, seria nessa modalidade que conseguiria os maiores feitos. Em 1920 participa nos Jogos Olímpicos. Na cidade belga de Antuérpia consegue ganhar duas medalhas. Nos pares masculinos vence a de ouro, enquanto na variante de pares mistos conquista a de prata.
Já depois das Olimpíadas, é em 1921 que, ao lado de Randolph Lycett, vence o torneio de pares mistos de Wimbledon. Ainda antes desses sucessos no ténis, já Max Woosnam, à custa de um novo trabalho na cidade de Manchester, tinha mudado de equipa. Com o Manchester City, mais uma vez recusando um contrato profissional, consegue os maiores feitos no futebol. Na temporada de 1920/21 ajuda o conjunto a chegar ao 2º lugar da “first division” e, por nomeação dos colegas, torna-se no capitão de equipa.
Aliás as suas capacidades de liderança seriam reconhecidas em muitos aspectos da sua vida. No desporto, essa característica levá-lo-ia, na única chamada à selecção inglesa, a envergar a braçadeira de capitão. Também no ténis seriam entregues à sua pessoa as mesmas responsabilidades. Na Taça Davis lideraria o conjunto britânico numa passagem pelos Estados Unidos da América. É dessa altura uma das histórias mais curiosas da sua vida. Convidado por Charlie Chaplin para sua casa, Max Woosnam não só derrotaria o actor no “court”, como, desafiado para uma partida de “ping-pong”, venceria o seu anfitrião usando uma faca de barrar manteiga!

899 - SERRA E MOURA

Tendo começado muito novo nas lides do desporto, a primeira modalidade que, com mais afinco, praticaria seria o atletismo. Tanto no salto em comprimento, como nas disciplinas de velocidade, Serra e Moura vestiria as cores do Sporting. Sempre de “Leão” ao peito, alguns anos mais tarde viria a descobrir aquela que acabaria por tornar-se na sua maior paixão.
No futebol, muito mais do que a entrega que mostrava dentro de campo, a sua grande característica era a habilidade que tinha com a bola nos pés. Numa altura em que a modalidade era mais força do que jeito, a arte que Serra e Moura mostrava em cada toque destacava-o dos demais atletas. Curiosamente, a estreia do médio na categoria principal leonina aconteceria já este contava com 26 anos de idade. Logo nessa temporada, a de 1924/25, o médio conseguiria amealhar para o seu currículo o “Regional” de Lisboa. Ainda que tenha feito apenas um jogo durante essa campanha, os sinais que deixaria permitir-lhe-iam ganhar um lugar no plantel. Já na época seguinte, o seu peso nos destinos da equipa seria bem diferente. Titular indiscutível, o jogador passaria a ser o “dono e senhor” da posição de interior-direito.
Apesar da sua preponderância no desenho táctico do conjunto “verde e branco”, as suas exibições melhorariam ainda mais com a sua mudança dentro de campo. Entendo que as suas características valeriam mais no miolo do terreno, Augusto Sabbo, treinador germânico e antigo atleta dos lisboetas do CIF, muda-o para médio-centro. A adaptação revelá-lo-ia como um grande estratega. Aliada a sua capacidade técnica, a maneira como lia o jogo faria dele o cérebro de toda a equipa. Essa condição faria dele um dos “capitães” do Sporting e, para além disso, levá-lo-ia à estreia com a “camisola das quinas”.
O dia 1 de Abril de 1928, convocado por Cândido de Oliveira, marcaria assim a sua estreia com as cores de Portugal. Para além desse particular frente à Argentina, pela selecção nacional Serra e Moura ainda teria a oportunidade de jogar mais 2 partidas. Apesar de contar com apenas 3 internacionalizações, a verdade é que a mística do jogador sentir-se-ia de imediato. Se mais provas não houvesse, então a braçadeira de “capitão”, entregue ao seu encargo aquando da sua segunda chamada, serviria como testemunha.
Infelizmente, e quando o seu perfil era já o de uma das maiores estrelas do futebol luso, uma grave infecção numa perna afastá-lo-ia da prática desportiva. Pior ainda foi quando a doença, mal debelada, passou à condição de septicémia. Espalhada pelo corpo, a contaminação ceifar-lhe-ia a vida.

898 - GUSTAVO TEIXEIRA


Com 10 anos de idade deixa a sua Vila Real natal para dar continuidade aos estudos na Casa Pia. Na escola lisboeta, sendo a ideia intrínseca à instituição, a prática desportiva começa a fazer parte da sua vida. Nas piscinas ou no campo da bola Gustavo Teixeira começa a destacar-se. Nesse sentido, e no mesmo ano em que entra para os seniores dos “Gansos”, faz a sua estreia pela selecção portuguesa de natação.
No futebol, sempre do lado canhoto do campo, é pelo ataque que começa. Sem ser muito veloz, a técnica, a capacidade de passe e o entendimento que tinha de toda a estratégia eram as suas armas. Tal era a evidência das suas capacidades que, ainda nas primeiras épocas como sénior, começa a ser requisitado por outros emblemas. Um dos desafios surgiria do Sporting que, tendo planeada uma digressão pelo Brasil, logo solicitaria a sua presença na comitiva. O convite acabaria por não resultar em nada mais. Contudo, as suas exibições ficariam na retina de muita gente. A imprensa local ficaria fascinada com tanta qualidade que acabaria por apelidar o atleta como o “Pé de Ouro”.
De volta ao Casa Pia, Gustavo Teixeira continuaria a representar a categoria principal. Jogando sempre ao mais alto nível, foi com normalidade que da selecção nacional chegaria a primeira convocatória. Tendo feito a estreia com a “camisola das quinas” num “amigável” frente à Bélgica, essa partida daria início a uma caminhada que, sensivelmente 8 anos depois, chegaria à dezena de participações.
O estatuto de internacional fez ainda com que fosse mais desejado. Em 1932, dessa feita pelo Benfica, é mais uma vez requisitado ao Casa Pia. Todavia, o desfecho da história seria diferente. Após envergar a camisola encarnada frente ao Barcelona, desafio que servia para comemorar o aniversário dos “Encarnados”, é endereçado a Gustavo Teixeira uma proposta. Ora, o convite é aceite e o atleta muda-se para as “Águias”. A partir dessa temporada de 1932/33, também os títulos passaram a fazer parte do seu currículo. Logo na época de estreia ajuda o clube a vencer o “Regional” de Lisboa. Depois viriam ainda as vitórias no Campeonato de Portugal de 1934/35 e, entre 1935/36 e 1937/38, o “Tri” no antigo no “Campeonato da Liga da 1ª divisão”.
Curiosamente, enquanto a sua carreira andava para à frente, a sua posição no campo evoluía para trás. Vítor Gonçalves, à altura treinador dos benfiquistas, entendo ser mais útil noutras partes do campo, começou por mover Gustavo Teixeira para o meio-campo. Daí ainda recuou mais um pouco. Sempre à esquerda, acabou como defesa e, por mérito da sua exemplar entrega, terminaria também como “capitão” de equipa.

897 - ANTÓNIO STROMP

Se mais nada houvesse, a data de 1 de Julho de 1906 seria o bastante para que entrasse na história do Sporting Clube de Portugal. Todavia, não só como fundador dos “Leões” fez da cronologia da colectividade lisboeta a sua. O jovem atleta haveria de gravar o seu nome das mais diversas maneiras. No futebol, no atletismo, no cricket, na esgrima e no ténis António Stromp tornar-se-ia no símbolo da maior bandeira do emblema da capital, o eclectismo.
Nessa sua caminhada, e tendo conseguido um lugar na categoria principal com apenas 16 anos, o extremo-direito rapidamente chegaria à condição de estrela maior do conjunto. A velocidade, aliada à habilidade com a bola nos pés, faziam dele um grande futebolista. Tal eram as suas qualidades que, cada vez que uma digressão era organizada, o seu nome era convocado para vestir as cores da selecção de Lisboa. Fosse em Espanha ou noutro país qualquer, eram para si os maiores destaques. Já numa tournée pelo Brasil, as suas exibições seriam de tal ordem boas que diversos clubes tentariam a sua contratação. No entanto, a paixão que tinha pela cidade “alfacinha” e pelo clube eram de tal ordem que todos os convites seriam recusados.
Mas não só de futebol seria a feita a sua passagem pelo desporto. De todas as modalidades já referidas, seria no atletismo que melhores performances obteria. Nas pistas, António Stromp seria um ganhador. Recordista Nacional no salto com vara, nos 100 metros e nos 200 metros, também na estafeta conseguiria adicionar troféus aos escaparates do Sporting. Seria também nas disciplinas de velocidade que participaria nos Jogos Olímpicos de 1912. Em Estocolmo, o multifacetado atleta tornar-se-ia, não só no primeiro sportinguista, como no primeiro português a participar numas olimpíadas. Os resultados não seriam famosos. Contudo, nem o facto de ter perecido logo nas primeiras rondas tira qualquer mérito à sua presença no certame organizado na Suécia.
Apesar de todo o sucesso, e de tudo o que o futuro parecia prometer, a sua carreira seria curta. Acossado por uma terrível doença, os últimos anos da sua existência seriam passados em retiro. A sífilis acabaria por vencer. Ainda assim, anos antes de decidir retirar-se de todas as competições, António Stromp daria um enorme contributo para a primeira grande conquista do futebol “Verde e Branco”. Na temporada de 1914/15, o atacante seria uma das personagens principais da vitória no Campeonato Regional de Lisboa.

896 - C. B. FRY

Se houve “homem dos 7 ofícios”, um deles, por certo, foi C. B. Fry. No entanto, muito mais do que ficar restrito às artes do desporto, os seus interesses abrangeriam uma enorme série de outras actividades. Desde o futebol, ao cricket, ao atletismo, ao rugby, passando pela política, diplomacia, jornalismo, ensino ou escrita, Charles Burgess entraria para a memória inglesa como uma das figuras mais brilhantes da sua história.
Ainda durante a adolescência, C. B. Fry mostrara ser bastante dotado em diferentes áreas. Para além dos estudos, onde a literatura era onde mais brilhava, também no desporto começava a mostrar excelsas qualidades. No futebol, onde era a figura de destaque na escola, aos 16 anos seria chamado pelos Casuals FC para disputar a Taça de Inglaterra. Já a ida para universidade não abrandaria o seu gosto pelo “jogo da bola”. Ao mesmo tempo que representava a equipa da Oxford University, o defesa entraria para outra equipa londrina, os Corinthian. Claro está que as suas habilidades só poderiam resultar numa coisa. Sendo um jogador refinado, pouco normal para a época, não foi muito difícil conseguir um lugar no Southampton. Ora, a presença numa equipa profissional permitir-lhe-ia alcançar outros sonhos. A 9 de Março de 1901, o central seria chamado a representar Inglaterra. Essa partida frente à Irlanda, marcante na sua carreira, só teria comparação com outro momento. Na temporada seguinte, participando em vários desafios, o atleta teria o prazer de também disputar a final da Taça de Inglaterra.
Também noutros desportos, como já aqui foi referido, C. B. Fry chegaria à elite das respectivas modalidades. No cricket, onde mais brilhou, alcançaria o estatuto de internacional, chegando, inclusive, a capitanear o seleccionado inglês. No atletismo, ainda antes do fulgor do futebol, já ele era uma estrela. Com capacidades que permitiam disputar diversas disciplinas, foi no salto em comprimento que mereceu os maiores louvores. Em 1892, aos 20 anos de idade, haveria de quebrar o recorde britânico. Sensivelmente um ano depois, foi a altura de tomar para si a marca mundial. Nesse momento histórico, mesmo não tendo ultrapassado a distância de Charles Reber, conseguira obteria o mesmo registo do norte-americano.
Muito para além dos estádios, também fora deles C. B. Fry conseguiria atrair atenções. Como assistente do seu antigo colega no cricket, Ranjitsinhji Vibhaji Jadeja, trabalharia na Sociedade das Nações (a actual ONU), em Genebra. Por outro lado, e mesmo sem conseguir ser eleito, concorreria pelo Partido Liberal a várias eleições.  Todavia, a história mais curiosa da sua vida, aconteceria aquando da sua passagem pela Suíça. Anteriormente ocupada pela Liga Balcânica, a declaração de independência da Albânia levaria a que muitos nomes surgissem como legítimos ocupantes do trono. Mas se por essa altura, o escolhido acabaria por ser Guilherme Frederico Henrique de Wied, diz-se que, já nos anos 20, o seu nome seria equacionado para preencher o lugar. O convite seria recusado pelo antigo atleta.

895 - ESPÍRITO SANTO

Benfiquista desde que a memória o consente, seria a mudança para a Angola que permitiria a Espírito Santo dar os primeiros passos no futebol. Longe da sua Lisboa natal e do clube do coração, a melhor solução encontrada para dar seguimento à paixão pelo jogo da bola seria o Sport Luanda e Benfica. Na filial das “Águias” estaria até que a sua mãe, insatisfeita por o jovem dar mais atenção ao desporto que aos estudos, o mandar de volta à metrópole e a casa dos avós. Contudo, já na capital, os intentos da sua progenitora sairiam gorados. O atleta decide inscrever-se nos treinos do Benfica, agrada e fica!
Tendo a agilidade de reflexos e a velocidade como grandes armas, a sua habilidade para marcar golos também não ficava muito atrás. Tudo junto faria com que, logo de início, conseguisse impressionar os responsáveis técnicos. Vítor Gonçalves, sem medo de arriscar, decide apostar no jogador para substituir o incontornável Vítor Silva. No lugar do seu ídolo de infância, a estreia de Espírito Santo ficaria na história do clube. Nessa temporada de 1936/37, o avançado-centro tornar-se-ia no mais jovem de sempre a jogar e a concretizar um golo pela equipa principal. Aliás, muitos foram os recordes que coloririam a sua carreira. Frente ao Casa Pia, numa partida a contar para o “regional alfacinha”, 9 golos por si concretizados permitiriam o quebrar de mais uma marca. Todavia, e ainda nesse campo, onde mais metas conquistaria seria… no atletismo!
É curiosa sua história. Diz-se que num dia em que treinava futebol, a saída da bola pela lateral mudaria o rumo da sua vida. Indo atrás do esférico, e estando os atletas do salto em altura a treinar à beira do campo, Espírito Santo decide galgar por cima de um obstáculo que o atrapalhava naquela perseguição. Sem bem entender o porquê, aquele pulo surpreenderia todos aqueles que ali estavam. A razão? O jovem futebolista tinha conseguido, sem qualquer preparação prévia, elevar-se até onde nenhum dos praticantes da modalidade tinha ainda conseguido. Ora, tal exibição só poderia acabar de uma maneira. Com a sua inclusão na equipa de atletismo, os resultados não demorariam muito a aparecer. Após uma fase inicial de adaptação, no Verão de 1938 os recordes nacionais do salto em altura, salto em comprimento e triplo salto passam a ter o seu nome.
A selecção nacional, incontestavelmente, também faria parte do seu currículo. Ainda assim, seria no rescaldo de uma partida com as cores de Portugal que Espírito Santo encetaria um dos períodos mais negros da sua vida. Depois de um jogo disputado em Bilbau, o seu estado de saúde ficaria pior. Agravada uma doença pulmonar que o afectava há alguns anos, o único remédio foi afastar-se da prática desportiva. No entanto, aquilo que todos pensavam ser uma solução de curto prazo, prolongar-se-ia por mais de 3 anos. Findo esse calvário, o avançado regressaria na segunda metade de 1943/44. Passando a jogar a extremo, o atleta juntaria ao já ganho mais alguns troféus. No cômputo desses dois períodos, e só no futebol, o atacante venceria 4 Campeonatos Nacionais, 3 Taça de Portugal e 1 Campeonato de Lisboa.
Em 1950, e depois de ter capitaneado o Benfica durante diversos jogos, Espírito Santo decidiria ser a hora certa para “pendurar as chuteiras”. Contudo, o seu trajecto como desportista prosseguiria. Mantendo a ligação aos “Encarnados”, o antigo futebolista passaria a jogar ténis. O vínculo com o clube, que manteria até aos últimos anos da sua vida, transformar-se-ia em merecidas distinções. Em 2000, seria agraciado com a “Águia de Ouro”. Já em 2004, pela altura da comemoração dos 100 anos do emblema lisboeta, seria nomeado Presidente Honorário do Centenário.

894 - ACÚRSIO

Nascido em Oeiras, seria na localidade dos arredores de Lisboa que Acúrsio, juntamente com o irmão mais novo, daria os primeiros passos no hóquei. Já a entrada na maioridade levá-lo-ia a outra aventura. Em Moçambique, para onde iria à procura de trabalho, as cores do Ferroviário de Lourenço Marques passariam a fazer parte da sua vida. No emblema da actual Maputo, o ecléctico praticante partilharia o tempo entre duas actividades desportivas. No futebol destacar-se-ia como guarda-redes. Já na modalidade em patins, curiosamente, a sua posição era no ataque.
Na sua evolução como desportista, e apesar da maior popularidade que o futebol sempre auferiu, seria no ringue de patinagem que Acúrsio mais depressa conseguiria destacar-se. Ainda em África, começaria a ser chamado à selecção nacional portuguesa, pela qual participaria no Mundial de 1954. Contudo, também no futebol dava cartas. A sua altura faria com que, nas bolas altas, conseguisse impor-se com relativa facilidade. Ainda assim, não era desprovido de bons reflexos e, entre os postes, as defesas que fazia eram fonte de grandes louvores.
Sendo um craque no futebol e no hóquei, o FC Porto, que procurava reforços para ambas as modalidades, veria nele um bom elemento para envergar as cores do clube. Tendo regressado a Portugal para a temporada de 1955/56, mais uma vez seria de setique na mão que começaria por destacar-se. Tornando-se no primeiro internacional “Azul e Branco” na disciplina dos ringues, já no “campo da bola” as coisas não começariam assim tão bem. Com Dorival Yustrich a dar preferência a Pinho, Acúrsio teria poucas oportunidades para jogar. Mesmo tendo conseguido vencer o Campeonato e a Taça logo no ano de estreia, o guarda-redes só conquistaria a titularidade no decorrer da 3ª época de “Dragão” ao peito. Curiosamente, seria nessa campanha de 1957/58 que viveria um dos momentos mais marcantes da sua carreira. No desafio da última jornada, num pontapé de baliza a baliza, o guardião inscreveria o seu nome na lista dos marcadores. Nessa vitória frente ao Belenenses, e já depois do tento conseguido, o atleta fracturaria o braço. Todavia, e ao contrário daquilo que seria esperado, não sairia e, aguentando as terríveis dores, terminaria o encontro.
As boas exibições na guarda da baliza do FC Porto, levá-lo-iam, por fim, a vestir as cores nacionais. Com a estreia em Maio de 1959, esse “amigável” disputado em Gotemburgo marcaria o começo de uma caminhada que, sensivelmente um ano depois, terminaria com um total de 7 internacionalizações. Às parcas partidas disputadas com a camisola de Portugal não é indiferente a decisão por si tomada, pouco tempo depois. Numa altura em que a profissionalização era um facto incontornável no nosso país, Acúrsio teria que dedicar-se em exclusivo ao futebol. Ainda assim, o atleta pouco tempo conseguiria viver com tal resolução. Desejando voltar a praticar ambas as modalidades, a solução encontrada fá-lo-ia voltar a Moçambique. Com mais um Campeonato (1958/59) a embelezar-lhe o palmarés, Acúrsio, no final da época de 1960/61,transfere-se de novo para o Ferroviário. Seria no emblema de Lourenço Marques, que o antigo jogador portista faria a transição para as tarefas de técnico. Ainda como treinador de hóquei, destaque para o seu regresso à terra natal, onde orientaria o AD Oeiras.

893 - OLIVEIRA MARTINS

Começaria por representar as camadas jovens do Sporting para, ainda em idade adolescente, chegar à 4ª categoria do futebol “verde e branco”. Mesmo sendo um atleta de excelência, a facilidade com que, ainda nesse primeiro ano de sénior, conseguiria chegar à equipa principal seria surpreendente. Essa celeridade, a mesma que o tinha levado a conviver com as maiores estrelas do clube, seria também aquela que empurraria o jovem atacante para o “onze” leonino.
Orientado pelo britânico Charles Bell, o sucesso que conseguia traduzia-se pela quantidade de golos que obtinha. Ao destacar-se na posição de avançado-centro, as suas exibições em muito contribuiriam para o sucesso da equipa. Ora, esse êxito levá-lo-ia também a vestir a camisola da selecção de Lisboa. Aliás, uma das histórias mais famosas na sua carreira envolveria as cores da capital. Numa altura em que era habitual jogar-se duas partidas no mesmo dia, Oliveira Martins, numa contenda frente à congénere do Porto, seria convocado para capitanear os “Alfacinhas”. Depois desse encontro disputado pela manhã, à tarde jogaria frente ao FC Porto. Nesse desafio a contar para a edição de 1928/29 do Campeonato de Portugal, o atacante seria o principal intérprete da vitória por 3-2, contribuindo com um “hat-trick”.
Todavia, aquilo que podia ter sido uma carreira de enorme sucesso, teria um final tão inesperado quanto o seu surgimento. Depois da contratação do avançado Rogério de Sousa em 1929/30, Oliveira Martins começaria a perder algum fulgor. Não sendo chamado a jogo com a mesma frequência, a solução passaria por representar as “Reservas” leoninas. O seu afastamento da equipa principal tornar-se-ia ainda mais notório com o agravamento de uma lesão. Distante das qualidades que o tinham tornado num ídolo da massa adepta, o fim do seu percurso como futebolista viria quando estava perto de completar 24 anos de idade.
Com o terminar da campanha de 1934/35, época em que se afastaria dos campos da bola, aqueles que pensaram que Oliveira Martins estava terminado para o desporto, enganaram-se. Separado da modalidade que o tinha empurrado para a popularidade, o antigo ponta-de-lança dedicar-se-ia a outras disciplinas. Basquetebol, onde chegaria a internacional português, andebol, râguebi ou atletismo fariam parte da lista de 11 modalidades em que também envergaria o “Leão” ao peito.
Sempre ligado ao Sporting, o ecléctico praticante também era um dedicado estudante. Licenciado em Ciências Económicas e Financeiras, as valências obtidas durante a vida académica levá-lo-iam a desempenhar diversos cargos de dirigente no emblema “verde e branco”. Tendo sido Vice-Presidente em diversas áreas e também membro do Conselho Fiscal, a dedicação de Oliveira Martins aos “Leões” permitir-lhe-ia a entrada na história da colectividade. O emblema lisboeta também não esqueceria a importância da sua devoção. Agraciado diversas vezes “pelos bons serviços” prestados ao clube, em 1950 seria condecorado como “Sócio Benemérito”.
Curiosamente, não só no desporto chegou ao estrelato. Tendo participado em diversos filmes, entre os quais “Maria do Mar”, “Fátima, Terra de Fé”, “Varanda dos Rouxinóis” ou “As Pupilas do Senhor Reitor”, Oliveira Martins foi um dos galãs do cinema português dos anos 30.

ECLECTISMO

Há certas coisas que no futebol de alto nível são, se não impossíveis, por certo impensáveis. Ter atletas que, entre diferentes modalidades, consigam dividir a sua atenção não é, nos dias que correm, exequível. Contudo, nem sempre foi assim! Futebol, atletismo, natação, ténis, hóquei, entre tantas outras, já souberam conviver em perfeita harmonia. É por isso que, durante o mês de Julho vamos falar de “Eclectismo”.