699 - MARIANO AMARO

É difícil ler algo sobre Mariano Amaro onde não venha referida a sua imagem de “alfacinha” boémio. Curiosamente, esse seu lado, nunca negado pelo mesmo, jamais haveria de servir de desculpa para que, no treino do dia seguinte, o seu afinco fosse menor. Essa sua entrega, constante durante todos os seus anos como futebolista, acabaria por servir de modelo a todos os seus colegas. Já o seu carácter generoso e, em muitas outras facetas, exemplar, fariam dele capitão e dos um dos mais amados no Belenenses.
Tendo começado a prática do futebol na colectividade lisboeta, o Sport Adicense, Mariano Amaro apareceria nas Salésias já perto de completar os 20 anos de idade. Sendo um extremo-esquerdo de origem, Artur José Pereira, no intuito de conhecer melhor as suas habilidades, decide experimentá-lo nas mais diversas posições. Guarda-redes, defesa ou avançado, por todos os lugares do campo haveria de passar. No entanto, acabaria por ser no miolo do terreno que mais se destacaria e onde, durante quase década e meia, faria carreira.
Sendo um dos ícones da história belenense, a este seu estatuto não é indiferente o facto de ter jogado durante os “anos de ouro” do clube. Mariano Amaro, pelos títulos conquistados, fará sempre parte das memórias do emblema da “Cruz de Cristo”. Todavia, recordá-lo apenas pelo Campeonato Nacional de 1945/46, pela Taça de Portugal de 1941/42 ou, até, pelos 2 Campeonatos de Lisboa que ajudaria a vencer (1943/44; 1945/46) seria, no mínimo, redutor. Para fazer justiça às suas qualidades de Homem e desportista, há que contar muito mais. Há que relatar a fidelidade que sempre mostrou ao clube; há que contar a os gestos que, mesmo tendo em conta os riscos que corria, não deixou de ter.
É verdade, Mariano Amaro, resultado das suas qualidades com futebolista, poderia ter tido uma vida mais confortável. Ainda assim, o aspecto financeiro, na hora de tomar a decisão, seria o que menos haveria de pesar. Quando o FC Porto o assediou, quando o Sporting o quis juntar ao seu plantel, ou, aquando do convite de Scopelli para jogar na Argentina, a resposta haveria de ser sempre a mesma – “Devo muitos favores ao meu clube, favores, creia, que muito dificilmente se pagam!”*.
Na selecção também haveria de ser grande. A estreia aconteceria a 28 de Novembro de 1937. Esse Espanha – Portugal que, por via da guerra civil no país vizinho, não seria reconhecido pela FIFA, acabaria por ser a primeira das suas 19 internacionalizações. Contudo, e apesar da importância de tal marca, seria outro duelo ibérico que ficaria na memória de todos. Desta feita jogado em Lisboa, no estádio do seu Belenenses, a contenda haveria de começar com um protesto. Na altura da saudação olímpica, eufemismo para “de extrema-direita”, 3 jogadores recusar-se-iam a tal cumprimento. Artur Quaresma, José Simões e Mariano Amaro seriam os protagonistas do referido “incidente” protocolar. Quaresma haveria de manter as mão atrás das costas, enquanto que os outros dois, ainda mais afoitos, ergueriam o braço direito, mas de punho cerrado.
Talvez os excessos que cometeu, na grande parte do seu percurso, não o tenham importunado muito. No lado direito do meio-campo, a naturalidade com que abordava todos os lances, impressionava até os mais habilidosos. Já a mestria dos seus passes ou a maneira excepcional como lia todo o jogo, eram apenas a confirmação do seu talento. Mas a falta de moderação que levava fora dos estádios, acabaria mesmo por pôr um fim à sua carreira. Já depois de, uns anos antes, ter sido obrigado a parar por detectadas insuficiências cardíacas, em 1948, na sequência de um episódio de cariz pulmonar, ser-lhe-ia diagnosticada tuberculose.
Ainda prometeria a todos que voltaria a jogar. Todavia, o regresso que tanto desejava, acabaria por nunca acontecer. Ao futebol continuaria ligado, mas já nas funções de treinador. No desempenho de tais tarefas, ficaria longe dos sucessos alcançados como praticante. Passou por diversos emblemas. Ainda assim, o tempo despendido aos comandos de Belenenses, “O Elvas”, Torreense, Oriental, Ac. Viseu, Sp. Covilhã ou Vitória de Guimarães, seriam apenas modestos contributos, por parte de alguém que muito já tinha dado ao futebol português.

*retirado da entrevista à revista “Stadium”, em 22 de Junho de 1938

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