1148 - ICA

De vez em quando elejo um atleta que, apesar de ter feito parte de um remoto imaginário de dominicais relatos radiofónicos e de coloridas colecções de cromos, pouco ou nada sei sobre a sua carreira. Porém, dentro desse grupo de futebolistas, há aqueles que, com algum esforço e com uma boa dose de pesquisa, é possível, com um certo grau de certeza, esquissar a sua caminhada profissional. Por outro lado, emergem aqueles cujos mistérios do seu trajecto competitivo são, numa impiedosa escala de dificuldade, bem superiores à minha vontade de contar uma história. Ica é, sem dúvida, um membro deste último grupo!
Aquilo que consegui descobrir sobre o ponta-de-lança brasileiro, pouco mais é do que o trajecto competitivo que, durante alguns, acabou por fazer em Portugal. Nesse sentido, a Oliveirense tornar-se-ia no primeiro emblema do avançado no nosso país. Ora, logo após essa temporada de 1981/82, a disputar o 2º escalão, surgiria a oportunidade de passar a representar o Recreio de Águeda. A mudança de colectividade, sem, com isso, deixar o patamar secundário e o Distrito de Aveiro, transformaria o avançado num dos principais esteios da promoção dos “Galos do Botaréu” à 1ª divisão.
Depois da campanha de subida, durante a qual iria consagrar-se como um dos titulares e como o melhor marcador da equipa, o atacante, à imagem da memorável página escrita na história do clube, também conseguiria estrear-se no escalão máximo. Contudo, contrariamente ao que tinha demonstrado no ano anterior, o jogador perderia o lugar no “onze” inicial. Essa temporada de 1983/84, em termos individuais e colectivos, transformar-se-ia numa grande desilusão. Ainda assim, e com a descida do Recreio de Águeda à 2ª divisão, Ica manter-se-ia no convívio dos “grandes”, acabando por mudar-se para o sul do país.
Já com as cores do Farense, exibições discretas não dariam muitas presenças em campo ao avançado. Seguir-se-ia o Leixões e, sem certeza do que vou escrever, o fim da sua caminhada em território luso. De resto pouco mais conseguirei dizer. Com algum grau de convicção poderei ainda fazer referência à sua passagem, a montante dos anos vividos em Portugal, pelo Campo Grande do Rio de Janeiro. Há ainda, sem ter conseguido confirmar tal informação, à presença de Ica no plantel de 1987 da Portuguesa dos Desportos…

1147 - CAMBRAIA

Com passagem pelos juniores do Sporting, só alguns anos depois, já ao serviço do Clube de Futebol “Os Marialvas”, é que António Cambraia voltaria a destacar-se. Por altura a disputar a 3ª divisão, o médio manter-se-ia pelo referido patamar durante apenas 2 temporadas.
As suas prestações ao serviço do emblema sediado em Cantanhede, levariam o treinador Fernando Cabrita a incluí-lo, ao lado dos jovens Veloso e António Sousa, no grupo de trabalho do primodivisionário Beira-Mar. No entanto, a estreia do atleta no escalão maior do futebol português, em termos de rendimento individual, não correria de feição. Com poucas partidas disputadas nessa campanha de 1978/79, ainda assim, o atleta manter-se-ia no plantel nas temporadas vindouras.
Mesmo preservando-se a aposta nos seus potenciais atributos futebolísticos, Cambraia só conseguiria conquistar uma presença regular no “onze” do conjunto aveirense, depois da despromoção da equipa ao 2º escalão, no final da época de 1979/80. Como titular, voltaria a chamar a atenção de outros emblemas e a mudança para o Recreio de Águeda na temporada 1982/83, transportá-lo-ia para uma das mais bonitas páginas da sua carreira.
Nos “Galos do Botaréu”, Cambraia tornar-se-ia num dos intérpretes que, com as suas exibições no sector intermediário, ajudaria a equipa a chegar, pela primeira vez na história, ao patamar máximo. Ainda que tendo feito parte desse ímpar episódio, o Recreio de Águeda, em 1983/84, acabaria também por ser a sua última experiência naquela que é a competição de maior relevância em Portugal. Daí em diante, a sua caminhada competitiva trilhar-se-ia nos escalões secundários e com passagens de volta no Beira-Mar e n’ “Os Marialvas”.
Seria noutro regresso que o atleta escreveria os derradeiros anos da carreira. De novo a envergar a camisola do Touring Clube Praia de Mira, emblema da sua terra natal e com presença no percurso formativo do médio, Cambraia prolongaria a sua caminhada competitiva até à viragem da década de 80 para a de 90.

1146 - MÁRIO WILSON

Descoberto no Desportivo de Lourenço Marques, Mário Wilson, com Juca como companheiro de viagem, chegaria a Lisboa com 19 anos de idade. No Sporting, com a árdua tarefa de substituir Fernando Peyroteo, a época de 1949/50, a primeira de “Leão” ao peito, até nem correria mal. Atacante corpulento e de sagaz vontade, logo nessa temporada de estreia sagrar-se-ia como melhor marcador dos “verde e branco”. Já a época subsequente, ainda que com bons números, não seria tão vistosa e, mesmo ao ajudar à conquista do Campeonato Nacional, o final da campanha significaria o fim da sua passagem por Alvalade.
Com intuito de dar continuidade à vida escolar, Mário Wilson decidir-se-ia pela Académica. Sem concordar com a mudança, os dirigentes leoninos tentariam, sem resultados práticos, reverter a transferência e forçar o regresso do jogador à capital. Infrutíferas as reclamações, pois as justificações dos responsáveis sportinguistas, tendo como base o aproveitamento escolar, não serviriam propósito algum e o atleta continuaria a trilhar o seu caminho em Coimbra.
Na “Cidade dos Estudantes”, Mário Wilson partilharia residência com personalidades como Almeida Santos ou Salgado Zenha e fraternizaria com Agostinho Neto, Mário Pinto de Andrade ou, o também seu colega de balneário na “Briosa”, Daniel Chipenda. Tamanho convívio despertá-lo-ia para as problemáticas políticas e, participando em reuniões secretas, para as questões da soberania das colónias portuguesas. Porém, não só no aspecto pessoal a sua vida conheceria uma radical transformação. Também dentro de campo a mudança surgiria. Ao ver na sua compleição física um atributo para o desempenho de funções diferentes às quais estava habituado, passaria do ataque para ocupar posição à defesa.
Destacar-se-ia, a envergar negro das camisolas da Académica, como central. Durante 12 temporadas, sempre na 1ª divisão, defenderia com intrépido brio as cores dos “Estudantes”. Chegaria, como grande exemplo que era, a capitão de equipa e já nos últimos anos como jogador, desempenharia, em simultâneo, as funções de futebolista e de adjunto. Passaria a treinador principal, depois de um ponto final na carreira de praticante, na campanha de 1964/65. Aos comandos da “Briosa”, onde orientou nomes como Toni, Artur Jorge, os irmãos Campos, Rui Rodrigues, Manuel António, Serafim, entre outros, levaria a equipa ao histórico 2º lugar no Campeonato de 1966/67 e, ainda na mesma temporada, à final da Taça de Portugal.
Numa longa carreira, trabalharia em diversos emblemas nacionais e nos marroquinos do FAR Rabat. Seria, no entanto, com o Benfica que alcançaria os seus maiores êxitos. Com quatro passagens distintas por aquele que era o clube do seu coração, conseguiria vencer o Campeonato Nacional de 1975/76 e as Taças de Portugal de 1979/80 e 1995/96. Também a sua experiência à frente dos destinos da selecção nacional contribuiria para elevar o seu estatuto de treinador. Orientaria Portugal na Fase de Qualificação do Euro 80. No cumprimento dessas funções acabaria por viver uma das maiores polémicas da sua vida profissional. Por altura de um “particular” frente à Espanha, marcado 8 dias antes de um AC Milan – FC Porto, a contar para a Taça dos Clubes Campeões Europeus, a convocatória incluiria 9 atletas dos “Azuis e Branco”. Os atletas portistas faltariam à chamada. Tal reacção daria jus a uma inflamada troca de palavras com José Maria Pedroto, acicatando uma relação que, tendo começado bem durante a passagem de ambos pela Académica, já há muito que andava bem azeda.

1145 - EDUARDINHO

Depois de envergar a camisola de algumas colectividades de âmbito local, seria no Marítimo que Eduardinho continuaria o trajecto formativo e daria os primeiros passos no futebol sénior. Estrear-se-ia na equipa principal dos “Verde-Rubro” na temporada de 1969/70. Tal como nos anos passados nos juvenis e juniores, o médio mostraria qualidades que levariam os responsáveis do conjunto funchalense e aferi-lo como um elemento deveras precioso. Esse valor faria com que o Sporting de Braga, durante esses capítulos iniciais da carreira do jovem futebolista, o convidasse para treinar “à experiência”. Os testes correriam de feição, mas no momento de rubricar o contrato com os minhotos, as saudades pela ilha da Madeira tomariam uma imensidão enorme e, com o regresso a casa em mente, recusaria a proposta dos bracarenses.
Voltaria ao Funchal e ao Marítimo, mas não muito tempo depois surgiria nova separação. Forçado a apresentar-se para cumprir o Serviço Militar Obrigatório, Eduardinho ver-se-ia na obrigação de partir para o território continental. Interrompida a carreira de futebolista em 1972, depois da passagem pelas Caldas da Rainha, seria colocado em Vendas Novas. Já no Alentejo, receberia um convite dos responsáveis pela colectividade local, o Estrela Futebol Clube. Aceitaria o desafio e, desse modo, aproveitaria para dar continuidade à prática da modalidade. O mesmo aconteceria após a sua incorporação nos contingentes destinados à Guiné. Em África passaria a vestir as cores da União Desportiva Internacional de Bissau e jogaria ao lado do antigo craque portista, o atacante Lemos.
Para a temporada de 1973/74 dar-se-ia o retorno à Madeira e ao Marítimo. Como um praticante de recorte técnico elevado e bom na condução do jogo ofensivo, seria no apoio ao sector atacante que o médio-ofensivo conseguiria destacar-se. Rapidamente conquistaria um lugar de relevo na equipa insular. Titular ao longo dos anos, o exemplo em que se transformaria, levá-lo-ia a envergar a braçadeira de “capitão”. Já como líder do balneário, a campanha de 1976/77 empurraria o atleta, e os companheiros, para um dos momentos mais importantes da sua carreira. Depois de na época mencionada conseguir ajudar à vitória no Campeonato Nacional da 2ª divisão, a subida de escalão levaria Eduardinho e os “Verde-Rubro” à estreia no patamar máximo nacional.
Seguir-se-iam outras 6 temporadas e sempre com o listado maritimista. Cumpridas, num cômputo, 13 campanhas no emblema madeirense, o término da época de 1982/83 representaria também o final do seu trajecto enquanto futebolista. Mesmo “penduradas as chuteiras”, Eduardinho manter-se-ia ligado à modalidade. Como treinador, mormente em funções de adjunto, começaria a caminhada no Marítimo. Passaria depois pelo Nacional, onde viria a trabalhar com José Peseiro. Aliás, seria como “braço direito” do referido técnico que o antigo atleta viveria muitas das experiências na condução de equipas. Sporting, Panathinaikos, Rapid Bucareste, a selecção da Arábia Saudita, Sporting de Braga e vários emblemas no Médio Oriente acabariam por preencher o seu currículo.

1144 - MANACA

Ainda como elemento do Sporting Clube da Beira, Manaca despertaria a cobiça dos grandes emblemas portugueses. A actuar como interior, os dois prémios de Melhor Marcador ganhos em Moçambique, seriam o tónico para que o Benfica e o FC Porto tomassem a decisão de lançar ao futebolista propostas para a mudança. Porém, como menor de idade, a transferência ficaria dependente da autorização do seu pai. Ao ser um aguerrido adepto do Sporting, o progenitor do jovem praticante recusaria as ofertas de ambos os clubes e só quando de Alvalade chegou um novo convite é que o cenário começou a mudar.
Depois de chegar a Lisboa para a temporada de 1965/66, onde o máximo que conseguiria seria a presença na equipa de “reservas” dos “Leões”, Manaca, na época seguinte, acabaria chamado à categoria principal do Sporting. Num plantel maioritariamente composto pelos recém-vencedores da Taça dos Vencedores das Taças, a sua entrada no “onze” transformar-se-ia numa missão quase impossível. Pouco jogaria e como solução para potenciar as suas qualidades, surgiria a hipótese do empréstimo.
Com a passagem pela Sanjoanense a conferir ao atleta o traquejo suficiente para enfrentar um contexto competitivo mais exigente, o regresso ao Estádio de Alvalade abriria a Manaca a porta a novas oportunidades. Ao entender que o jogador poderia render mais noutras posições, a adaptação perpetrada por Fernando Vaz levá-lo-ia para o sector mais recuado da equipa e, de forma positiva, representaria uma mudança de paradigma na sua carreira. Já como lateral-esquerdo, mas que também podia actuar pela direita ou no centro, a regularidade com que passaria a ser chamado a jogo elevá-lo-ia ao estatuto de elemento essencial no esquema táctico. Como titular do Sporting, a hipótese de uma chamada à selecção nacional surgiria no horizonte como um passo natural. No entanto, as críticas lançadas na empresa ao seleccionador Manuel da Luz Afonso, retirá-lo-iam dos planos da Federação e o defesa jamais alcançaria a tão almejada internacionalização.
Mesmo afastado da “camisola das quinas”, Manaca continuaria a ser importante nos sucessos dos “Verde e Branco”. Na obtenção de títulos, o defesa ajudaria ao triunfo em 6 competições. Após a conquista do Campeonato Nacional de 1969/70 e da Taça de Portugal do ano seguinte, o atleta assumir-se-ia como peça fulcral na vitória da edição de 1973/74 da mais importante prova do calendário futebolístico português e, ainda, em 3 outras caminhadas vencidas da “Prova Rainha”.
Curiosamente, numa altura em que era tido como um dos melhores atletas do conjunto leonino, Manaca acabaria por deixar o Sporting. Especulados desentendimentos entre diferentes facções do balneário, levariam o defesa a sair do emblema alfacinha. Seguir-se-iam a curta passagem por Boston Minutemen, onde jogaria ao lado de Eusébio, António Simões, Nelson Fernandes e Jorge Calado, e as experiências com as cores do Vitória de Setúbal e do Sporting de Braga, orientado em ambas por Mário Lino.
Depois de, pelos minhotos, ter ajudado à vitória na Taça da Federação Portuguesa de Futebol e da presença, na mesma temporada de 1976/77, na final da Taça de Portugal, Manaca, por uma última vez, voltaria a Alvalade. Surpreendentemente, após uma época em que participaria em grande parte das pelejas, uma remodelação do plantel arrolaria o atleta como um dos elementos a dispensar. O Vitória de Guimarães abrir-lhe-ia as portas. Todavia, seria no regresso ao Minho que viveria um dos momentos mais polémicos da sua caminhada profissional.
Já no final da 2ª campanha ao serviço do conjunto vimaranense, num desafio frente ao Sporting, o jogador marcaria na própria baliza e, com a vitória dos “Leões”, praticamente afastaria o FC Porto da corrida pelo Campeonato Nacional. Na sequência do lance, os responsáveis dos “Dragões” viriam a público acusar o jogador de ter sido corrompido pelos adversários. Nada ficaria provado, mas o estigma colar-se-ia ao defesa e, recorrentemente, é alvo de novas conversas – “Esse autogolo serviu para distrair o povo português e afastar aqueles que eram os mais cumpridores do que é o futebol, dando espaço de manobra a 20 anos de vergonha, mentira e negócios obscuros. Aproveitaram para fazer isto tudo, como se fossem vítimas de uma cabala (…).Depois desse acontecimento, controlaram, dominaram, fizeram do futebol português aquilo que ele é hoje”*.
Na 1ª divisão, envergaria ainda o emblema do Estoril-Praia. Com a passagem pela agremiação sediada na Linha de Cascais, Manaca chegaria a um cômputo de 15 temporadas no escalão máximo do nosso futebol. Mais tarde, jogaria ao serviço do Peniche, onde também encetaria as funções de treinador. Como técnico passaria depois pelo Sacavenense, antes de viajar para o Canadá, onde passaria a residir.

*declarações de Manaca sofre o episódio, incluídas no artigo publicado em www.record.pt, a 27/04/2010

1143 - BETO VIDIGAL

Sendo o mais velho dos irmãos futebolistas da família Vidigal, Beto, entraria para “O Elvas” ainda em idade de formação. Na temporada de 1982/83 surgiria a oportunidade para estrear-se no conjunto principal do emblema alentejano. Depois de 2 primeiras campanhas em que a habitual adaptação a um contexto competitivo mais exigente levá-lo-ia a ficar na sombra de colegas mais experientes, as suas capacidades haveriam de pô-lo em plano de destaque. Nesse sentido em muito contribuiriam as aptidões técnicas, visão de jogo e forte componente física. Aliás, dir-se-ia de si ser o mais habilidoso do “clã” e até o irmão Toni haveria de concordar com tal avaliação – “Era craque. Nos tempos de hoje, estava no Sporting, Benfica ou FC Porto e jogava de caras. Era muito bom”*.
Como um dos elementos em destaque no conjunto elvense, Beto Vidigal tornar-se-ia num dos pilares do regresso da equipa ao patamar maior do futebol português. Depois de ajudar à promoção, a época de 1986/87 tornar-se-ia na da sua estreia na 1ª divisão. No convívio com os “grandes”, manter-se-ia como um elemento relevante nas manobras tácticas do treinador Carlos Cardoso e, com a saída deste, de António Medeiros. Um dos factores para tal, seria a sua inteligência, permitindo-lhe actuar em diferentes posições dentro do terreno de jogo. Fosse no meio-campo ou em funções com pendor mais atacante, fosse descaído para a esquerda ou em lugares mais centrais, a verdade é que as suas exibições raramente seriam alvo de aferições negativas.
Com o alargamento a 20 equipas, o “O Elvas”, apesar do 16º posto na tabela classificativa, conseguiria prolongar a estadia na 1ª divisão por mais uma temporada. No plantel manter-se-ia Beto Vidigal e sempre merecedor de rasgados elogios. Contudo, a campanha de 1987/88 tornar-se-ia na última do atleta no escalão máximo. A mudança para o Louletano encetaria uma caminhada que perpetuaria a sua carreira pelos escalões secundários. Mesmo ao conseguir exibições de bom nível, a verdade é que o jogador não voltaria aos escaparates principais. Seguir-se-ia, na recém-criada divisão de honra, a passagem pela União de Leiria. Depois viria um curto regresso ao “O Elvas”, a Naval 1º de Maio, o Vila Real e, como derradeira etapa na sua caminhada competitiva, o envergar de novo da camisola azul e oiro.
Numa carreira de futebolista sénior que atingiria as duas décadas de duração, as 13 campanhas disputadas com o “O Elvas” fariam dele um dos históricos do emblema alentejano. A sua ligação manter-se-ia depois de deixar os campos. Como treinador, tendo chegado a adjunto da equipa principal, Beto Vidigal fortaleceria, ainda mais, a sua ligação com a equipa fronteiriça.

*retirado da entrevista conduzida por Romilson Teixeira e publicada em https://davidjosepereira.blogspot.com, a 28/03/2021

1142 - ELEUTÉRIO

Começaria a prática do futebol ainda como atleta do Grupo Desportivo “Os Fósforos”. Em 1946 viria a assistir à união do seu emblema com o Marvilense Futebol Clube e o Chelas Futebol Clube, dando, desse modo, origem ao Clube Oriental de Lisboa. Mas muito mais do que testemunhar o nascimento da histórica colectividade, Eleutério, ao integrar os planteis do novo emblema “alfacinha”, ajudaria a consolidar o sonho de um conjunto de entusiastas da modalidade.
A sua integração na categoria principal, com registos desde a temporada de 1947/48, faria com que a cotação do jogador começasse a subir. Como um dos pilares do sector intermediário, seria também por razão da sua dedicação que, depois da promoção conseguida na campanha anterior, o Oriental conseguiria, na edição de 1950/51 do Campeonato Nacional, estrear-se na 1ª divisão. Com a disputa do patamar máximo do futebol português e com a visibilidade daí resultante, Eleutério começaria a ser observado por emblemas de grande monta. Daí até à transferência para outra colectividade seria um pequeno salto e na época de 1952/53, o centrocampista daria início aos seus trabalhos com o FC Porto.
De “azul e branco”, o atleta cumpriria 5 temporadas. Lançado pelo treinador argentino Lino Taioli, logo no ano da chegada, Eleutério, ocupando posição na esquerda do meio-campo, tornar-se-ia num dos elementos com mais chamadas ao “onze”. Manteria a posição com a entrada de Cândido de Oliveira a meio da primeira época, estendo o estatuto de titular para a campanha seguinte. Aliás, 1953/54 tornar-se num dos mais importantes ciclos da sua carreira desportiva. Com o lugar na equipa alicerçado em boas exibições, a chamada à principal selecção portuguesa surgiria com naturalidade. Chamado a jogo por Salvador do Carmo, a Bélgica, num “particular” disputado em Março de 1954, serviria para alimentar a única internacionalização do seu trajecto.
Mesmo diluída a preponderância alcançada nos 2 primeiros anos com os “Dragões”, Eleutério manter-se-ia integrado no plantel principal. Com Joaquim Machado, inicialmente, a roubar-lhe o lugar, a introdução, por Dorival Yustrich, de um novo esquema táctico, acabaria por acentuar a sua perda de importância. Ainda assim, o atleta haveria de celebrar a “dobradinha” conquistada em 1955/56. Chamado pelo famoso técnico brasileiro à disputa de apenas 5 partidas oficiais, o médio veria as vitórias no Campeonato Nacional e na Taça de Portugal a enriquecerem o seu currículo.
Depois de envergar pela última vez o listado “azul e branco” no decorrer da temporada de 1956/57, o futebolista daria continuidade à carreira desportiva. Com a mudança a acontecer não para muito longe do Estádio das Antas, seria o Salgueiros, a militar na 1ª divisão, que abriria, ao atleta, as portas das competições organizadas na época de 1957/58.

1141 - CAIO JÚNIOR

Como um dos destaques das “escolas” do Grêmio de Porto Alegre, Caio Júnior haveria de ser promovido à equipa principal na temporada de 1985. Logo na campanha de estreia pelos seniores, onde viria a encontrar-se com Valdo, o jovem atacante haveria de confirmar toda a esperança nele depositada e, ao sagrar-se o Melhor Marcador do Campeonato Gaúcho, daria, com os seus golos, uma ajuda de enorme importância para a conquista da referida edição do “estadual”.
Seguir-se-iam, nas 2 épocas seguintes, outros tantos triunfos no Campeonato Gaúcho. O destaque conseguido com esses êxitos, mas, principalmente, as boas exibições, levariam outros emblemas a olhar para o avançado como um bom reforço. Surgiria então o Vitória de Guimarães como a materialização de um “namoro” antigo e como a oportunidade para Caio Júnior entrar no tão almejado futebol europeu. No Minho a partir de 1987/88, o atleta conseguiria afirmar-se como um dos jogadores de maior preponderância no seio do plantel. Cotado como um futebolista com boa visão de jogo e técnica bem acima da média, mesmo sem a capacidade goleadora revelada nos primeiros anos como profissional, o seu contributo para a construção das acções ofensivas faria dele um dos bons elementos do colectivo vimaranense.
Curiosamente, depois de na temporada de chegada a Portugal ter conseguido destacar-se, a época seguinte, campanha em que o Vitória Sport Clube venceria a Supertaça, mostraria um jogador mais discreto. Rapidamente recuperaria a importância e, já sob a alçada de João Alves e recuado para o lugar de segundo avançado, faria, provavelmente, as melhores campanhas com a camisola branca dos minhotos. Aliás, o referido treinador tomaria uma importância vital no evoluir da carreira do atacante. Para além da adaptação a uma posição mais adequada às suas capacidades desportivas, alguns passos dados por Caio Júnior depois da passagem pela “Cidade Berço” dever-se-iam à admiração que o treinador nutria por ele.
Já com o “Luvas Negras” aos comandos do Estrela da Amadora, o convite dirigido ao avançado, fá-lo-ia mudar-se para a equipa da Linha de Sintra. Ao fim de 5 anos no norte do país, começaria, na temporada de 1992/93, por ajudar os “Tricolores” a regressar ao patamar máximo do futebol português. Depois, ainda na Reboleira, viria mais uma campanha na 1ª divisão, a qual precederia o regresso ao Brasil, a entrada no Internacional de Porto Alegre e a vitória no Campeonato Gaúcho de 1994.
A partir dessa altura o trajecto de Caio Júnior entraria numa fase mais errante. Ao dar corpo a mais um pedido de João Alves, retornaria a Portugal para envergar o emblema do Belenenses. Definitivamente de volta às competições brasileiras, passaria por diversos clubes, com destaque para o Paraná e para a conquista da edição de 1997 do Campeonato Paranaense. Já com o final do milénio, o avançado decidir-se-ia pelo fim da caminhada enquanto atleta para, quase de imediato, abraçar as tarefas de treinador. Nas novas funções, com a carreira, em grande parte, cimentada no Brasil, o antigo futebolista veria as suas qualidades cada vez mais apreciadas. Para tal, em muito contribuiria o trabalho feito, por exemplo, no Paraná ou no Palmeiras. Os seus feitos, nesses dois emblemas, incluiriam a primeira qualificação de sempre do conjunto sediado em Curitiba para a Copa Libertadores ou, na sequência da campanha feita na agremiação paulista, o prémio de treinador do ano de 2007, atribuído pela CBF.
Ao tornar-se no último emblema da sua carreira, o treinador assumiria os destinos da Chapecoense. Com o emblema de Santa Catarina, voltaria a ter resultados meritórios, nomeadamente na Copa Sul-Americana. Seria na disputa da referida competição que encontraria um fim trágico. Na viagem para a disputa da 1ª mão da final, o avião onde viajava a comitiva brasileira despenhar-se-ia, levando consigo o treinador e grande parte dos passageiros. Como homenagem aos malogrados e em respeito ao fatídico episódio, os colombianos do Atlêtico Nacional, abdicariam da prova e dariam o título ao conjunto adversário. Com tão bonito gesto, Caio Júnior acabaria por vencer o troféu mais importante da sua caminhada pelo futebol.

1140 - FORMOSINHO

Depois de terminar a formação no emblema mais representativo da sua cidade, seria também no Vitória de Setúbal que Formosinho, na temporada de 1974/75, conseguiria estrear-se no patamar sénior. Todavia, e mesmo sendo um nome chamado regularmente aos trabalhos das jovens selecções portuguesas, a verdade é que o médio demonstraria algumas dificuldades em conquistar um lugar no “onze” dos “Sadinos”.
Após ser lançado pelo “magriço” José Augusto e tendo em conta um crescimento que, ao longo das épocas seguintes, revelar-se-ia positivo, a verdade é que o centrocampista seria várias vezes tido como uma escolha secundária. Ainda que sempre a disputar a 1ª divisão, Formosinho, 5 temporadas após a promoção à equipa principal, tomaria a decisão de dar outro rumo ao percurso profissional. Escolheria, sem abandonar o escalão máximo, o Varzim orientado por António Teixeira. Na nova equipa, para onde entraria na temporada de 1979/80, o atleta veria a mudança trazer os seus frutos e, como um dos jogadores mais vezes chamados à ficha de jogo, atingiria a titularidade de forma regular.
Seguir-se-ia, 2 anos passados sobre a chegada à Póvoa do Varzim, a entrada no Amora. Com mais uma experiência gratificante no seu percurso, o traquejo ganho pelo médio levá-lo-ia, em 1982/83, a voltar ao Estádio do Bonfim já com outro estatuto. Estimado como um atleta de indubitável cariz primodivisionário, no regresso ao Vitória de Setúbal, Formosinho, de forma quase indiscutível, agarraria um lugar na equipa inicial. Acrescentaria, nessa segunda passagem pelo conjunto do listado “verde e branco”, outras 5 campanhas na 1ª divisão e, desse modo, justificaria a sua entrada para o rol de históricos do emblema setubalense.
Já na fase final do seu trajecto enquanto praticante, o médio viajaria até ao Sul do país. No Algarve, depois de algumas épocas ao serviço do Farense, o Olhanense surgiria na caminhada do atleta como a oportunidade para fazer a transição dos relvados para as tarefas de técnico. Com essa temporada de 1990/91, no papel de jogador-treinador, a marcar o arranque de outra fase na vida profissional de Formosinho, o seu percurso como “timoneiro” empurrá-lo-ia para uma longa carreira. Apesar de nunca ter conseguido orientar uma equipa no escalão máximo português, as passagens por diferentes clubes de grande tradição em Portugal serviriam para valorizar as suas competências. Destaque também para as experiências na Arábia Saudita, Vietname, Angola, Tunísia, Malásia e Sudão ou ainda as diversas colaborações com José Mourinho que levaria o antigo futebolista a trabalhar no FC Porto, Real Madrid, Manchester United e Tottenham.