182 - NENÉ

Quando, em 1966, o pai de Nené endereçou ao irmão alguns recortes de jornais, onde era possível ler que o jovem atleta tinha sido eleito o Melhor Jogador do Campeonato Moçambicano de juniores, nunca supôs estar a dar o primeiro passo para o aparecimento de uma das grandes lendas do futebol português. Por outro lado, também é fácil imaginar que, provavelmente, para além do normal orgulho em mostrar o feito do filho, essa carta terá tido outro propósito. É que o destinatário de tal correio era Norberto Cavém, antigo jogador e pai de Domiciano Cavém, astro maior do futebol benfiquista. Já página seguinte da história é fácil de adivinhar: o jovem acabou por trocar o Ferroviário da Manga pela “Luz”.
No Benfica terminou a formação e, em 1968, pela mão de Otto Glória, chegou à equipa principal. Apesar de, desde cedo, mostrar uma aptidão excepcional para o jogo, as duas primeiras temporadas entre os seniores, ainda na sombra de outros craques, foram discretas. Contudo, a velocidade e a técnica apontaram-no logo como o sucessor natural de José Augusto. Sem nada ficar a dever ao bicampeão europeu, o jovem extremo começou a talhar o seu próprio caminho. O sucesso foi tal que, em 1972, chegou a ser sondado pelo Real Madrid, cujo convite, sem hesitar, recusou.
Nené continuou a crescer em direcção ao estrelato. Em 1973 deu mais uma prova do seu valor quando, ao juntar-se a nomes como Eusébio ou Cruijff, fez parte da selecção da Europa. Nessa evolução, manteve-se pela banda direita do campo até que Mário Wilson, ao aperceber-se da inteligência com que atacava as bolas, decidiu transformá-lo num ponta-de-lança. Em boa hora o fez, pois a adaptação pensada pelo "Velho Capitão", tirando raras excepções, resultou em bem mais de 20 golos por ano. Foi assim na temporada de 1980/81, em que, para além de marcar um “hat-trick” na final da Taça de Portugal, conquistou o lugar cimeiro na tabela dos Melhores Marcadores do Campeonato Nacional.
Também na Supertaça, Nené soube inscrever o seu nome de forma indelével. Depois de 2 edições “informais”, a prova de 1981/82, já organizada pela Federação Portuguesa de Futebol e sob a égide de Cândido de Oliveira, fez do atacante o primeiro a marcar, “oficialmente”, na competição. Porém, apesar de prolífero, o avançado nunca foi consensual no “Terceiro Anel”. Muitos foram os apupos e as acusações a apontá-lo como pouco lutador –“É verdade que havia uma minoria de adeptos que me assobiava porque eu não sujava os calções, porque eu evitava o choque, porque eu não fazia carrinhos despropositados, porque eu não me esforçava naquelas bolas longas e irremediavelmente perdidas. Com a quantidade de golos que marquei, chego à conclusão que, se calhar, era mais esperto que os outros, não? Alguém marca golos deitado? No chão? Não, é de pé. E eu lá estava sempre em pé, a empurrar a bola para a baliza”*.
Tantos foram os golos que, ainda agora, para juntar às 590 partidas disputadas e que fazem de Nené o jogador com mais jogos pelo Benfica, há os seus 359 remates certeiros e, atrás de Eusébio e José Águas, o 3º lugar nos melhores marcadores da história das “Águias”.

*adenda feita à publicação original, com texto retirado do livro “101 Cromos da Bola” (Lua de Papel), Rui Miguel Tovar, 2012

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