682 - DI STÉFANO

Curiosamente, aquele que hoje é visto com um dos maiores jogadores da história, nem sempre quis ser futebolista. Com o sonho de seguir a vida de aviador, o antigo avançado apenas começaria a sua carreira aos 17 anos. Instigado por um amigo da família, Di Stéfano lá se deixaria convencer e acabaria por ir treinar ao River Plate. De imediato, apercebendo-se das suas qualidades excepcionais, os responsáveis pelo emblema de Buenos Aires tratariam de tudo para que o jovem continuasse ao serviço do clube. Começando na 4ª categoria, o atacante, rapidamente, foi subindo de escalão. Contudo, a sua chegada à equipa principal (1945) coincidiria com a existência de uma das linhas avançadas mais poderosas da história do clube. A presença de José Manuel Moreno, Félix Loustau, Adolfo Pedernera, Juan Carlos Muñoz e Ángel Labruna faria com que o recém-promovido avançado ficasse sem lugar no “onze” inicial.
A falta de espaço resultaria num empréstimo ao Huracán. A cedência, que duraria um ano, daria oportunidade a Di Stéfano para melhorar as suas qualidades, e, acima de tudo, para provar aos detentores do seu “passe” que o lugar dele era no alinhamento titular. Ora, de regresso ao River Plate, Di Stéfano deparar-se-ia com um cenário, em certa medida, diferente. Com Pedernera transferido para Itália e com alguns dos seus colegas afastados por decisão médica, “O Flecha Loura”, alcunha que havia ganho ao serviço do Huracán, tinha o caminho livre para entrar de início. Veloz, com uma capacidade de passe e remate irrepreensíveis, Di Stéfano adicionava às capacidades físicas e técnicas uma postura muito combativa. A influência que mostrava dentro de campo, estando presente em quase todas as situações de jogo, faria com que, bem depressa, conseguisse impor-se. Tornando-se indispensável no escalonamento da equipa, o atleta dava assim os primeiros passos para se tornar num dos grandes mitos do séc. XX.
Como uma das principais figuras do River Plate, também não demorou muito tempo para que da selecção argentina recebesse a sua primeira chamada. Logo nesse ano de estreia pela “Alvi-Celeste”, Di Stéfano é convocado para participar no “Sul-Americano de Selecções” de 1947. Na competição que agora conhecemos como Copa América, o atacante seria o pilar dessa caminhada vitoriosa. Numa altura em que o torneio era disputado em formato de liga, os golos de Di Stéfano acabariam por ser fulcrais para que a “Equipa das Pampas” terminasse na dianteira da tabela classificativa.
Até nisto das selecções, Di Stéfano conseguiria trilhar uma caminhada peculiar. Tendo representado a equipa nacional do seu país natal, o jogador ainda vestiria a camisola de mais duas nações. Já depois de se mudar para a Colômbia, resultado de um período conturbado no futebol argentino e que culminaria com uma greve geral por parte dos atletas, o atacante decide transferir-se para o Millonarios. A jogar em Bogotá, e à luz de regulamentos que não impediam os futebolistas de representar diferentes países, Di Stéfano, participando em 3 partidas de cariz particular, aceitaria jogar pela equipa colombiana.
Seria já durante o período passado na Colômbia que o assédio de alguns dos melhores clubes europeus começaria. O Barcelona, depois de, durante uma “tournée” com passagem por Espanha, ter conferido as suas boas qualidades, decide encetar algumas negociações. Ora, é aqui que começa toda uma grande “novela”. Estando a jogar numa liga que não era reconhecida pela FIFA, a sua ida para a Colômbia, à revelia do River Plate, também tinha sido julgada como ilegal. Considerando o Barcelona que quem detinha os direitos do jogador eram os de Buenos Aires, desdenha da pretensão do Millonarios em ser tido nos acordos de transferência. A mudança dá-se e Di Stéfano, em disputas amigáveis, chega a vestir a camisola “blau-grana”. Nisto, entra em cena o Real Madrid, que chega a um acordo com os colombianos. No meio de tamanha confusão, dá-se a intervenção do General Moscardo, Ministro dos Desportos, decidindo que, nos 4 anos vindouros, alternado nas temporadas, o atleta representaria, ora o clube catalão, ora os da capital espanhola. Não agradado com a decisão, e acusando o governo do General Franco de tomar decisões tendenciosas, os responsáveis pelo Barcelona decidem “rasgar” o contrato que ligava clube e atleta.
Com a posição tomada pelo Barcelona, Di Stéfano acaba por mudar-se, em definitivo, para Madrid. No clube dirigido por Santiago Barnabéu, o “astro” personificaria uma época que, com o início da Taça dos Campeões Europeus, firmaria o Real Madrid na história do futebol mundial. Tendo o clube conseguido vencer as 5 primeiras edições da recém-criada prova, o atacante catapultar-se-ia como uma das maiores estrelas da modalidade. Ao lado de Puskás, Gento, Kopa e tantos outros craques, o futebolista inscreve a sua imagem como a do ídolo maior de uma geração. Os títulos ganhos internamente, com destaque para os 8 campeonatos, só ajudariam a sublinhar esse seu figurino. Mesmo não tendo participado em nenhum Mundial – seria afastado da convocatória espanhola em 1962, por razão de uma lesão – a sua carreira sairia sem um único belisco. Nesse percurso, que duraria até perto dos 40 anos, Di Stefáno tornar-se-ia numa das personagens que, para sempre, perdurará nas memórias e lendas do futebol.
Já depois de, com as cores do Espanyol, ter posto um ponto final numa longa vida como futebolista, Di Stéfano enceta as suas funções como técnico. Nessa nova actividade, quase impossibilitado de atingir o sucesso que havia conseguido dentro das “quatro linhas”, escreve um currículo que em nada o envergonharia. Numa caminhada que, mormente, o levaria a alternar a morada entre a Argentina e Espanha, também ele haveria de conseguir importantes feitos. Campeão tanto no Boca Juniors, como no River Plate, Di Stéfano repetiria o feito ao serviço do Valencia. Também nos “Los Che”, haveria de vencer a Taça dos Vencedores das Taças de 1979/80 e, na época seguinte, a Supertaça da UEFA.
Com estes títulos europeus, o treinador lançar-se-ia para a linha da frente dos técnicos mundiais. É já com este estatuto que Di Stéfano chega ao Sporting. Contudo, a sua passagem por Lisboa, muito mais do que marcada pelo insucesso, haveria de ter contornos bem caricatos. Depois de numas férias passadas em Benidorm se ter cruzado com João Rocha, um acordo verbal é feito entre os dois. O pior é que a pré-época que se seguiria, muito longe de correr de feição, seria um total desastre. Pressionado pelos associados que, ainda há bem pouco tempo tinham visto o seu clube celebrar a “dobradinha” de 1973/74, o Presidente leonino acaba por dispensar o treinador. O curioso é que o contrato apalavrado, nunca havia sido passado para o papel. Ora, Di Stéfano acabaria por deixar Alvalade sem direito a qualquer indeminização e sem nunca ter orientado os de “verde e branco”, num só jogo oficial.

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