340 - TONI

De nome completo António José Conceição Oliveira, Toni nasceu na pequena Mogofores. Com o talento para a bola a despontar cedo, logo deu para entender que a sua habilidade era bem maior do que a aldeia onde morava. Rapidamente entrou para o emblema da sede de concelho, o Anadia. Foi aí que a Académica, orientada por Mário Wilson, com craques como os irmãos Vítor Campos e Mário Campos ou Gervásio, descobriu esse jovem médio de capacidades atléticas invejáveis. Foi o próprio "Velho Capitão" que conduziu até à Anadia para falar com o pai de Toni e para, desse modo, convencê-lo a deixar o filho a mudar-se para Coimbra. Após uma conversa em que ficou assente que o atleta, independentemente da carreira desportiva, não podia descorar a escola, o acordo consumou-se e o jovem praticante lá seguiu caminho para a "Cidade dos Estudantes". O engraçado chegou logo a seguir e com o carro do referido treinador -  "à saída da Anadia, o Fiat 600 não pegava e eu tive de empurrá-lo. Lá dentro, o Mário Wilson e um senhor da Académica chamado Augusto Martins"*.
Na "Briosa" não teve a vida fácil. Com a equipa recheada de estrelas e a atravessar, na sua história, uma das melhores fases, a entrada de Toni no "onze" titular não foi tarefa fácil. Talvez a grande mudança nesse paradigma tenha ocorrido na final da Taça de Portugal de 1966/67. Depois de dois prolongamentos (na altura não havia desempates por grandes penalidades) e o golo de Jacinto João a oferecer o troféu ao Vitória Futebol Clube, o rescaldo do embate acabou a consagrar o centrocampista como uma das agradáveis surpresas.
Com um físico notável, uma capacidade de abnegação acima da média e uma maneira simples de jogar e a coadunar-se, de que maneira, com a posição de médio-defensivo, facilmente o Benfica viu nele o substituto ideal para um Mário Coluna a aproximar-se do fim da carreira. Por essa razão, a troco de 1300 contos, a Académica teve de deixar partir, para nova aventura, o seu "Craque Saloio" - "Eu ficava sempre a ajudar o capitão a treinar os guarda-redes e dava-lhes a folha seca. Aqueles remates cortados com efeito banana. Eles não gostavam nada disso. Ficavam lixados e diziam-me: «Olha-me este, armado em craque saloio, ó caraças»"**.
No Benfica, foi a altura de viver momentos arrebatadores. Ao lado de estrelas como Eusébio, o já mencionado Coluna, José Torres, Simões, Jaime Graça, entre tantos outros, Toni passou a viver aquilo que poderá dizer-se, e não estarei muito enganado ao afirmá-lo, a melhor fase da sua vida como homem do futebol. Foram 32 anos ligados às "Águias". Teve as mais diversas funções, desde, como é lógico, futebolista, técnico-adjunto, treinador-principal e até director-desportivo. Em todas essas temporadas tornou-se num dos eternos símbolos do clube e, mais nada houvesse a prová-lo, bastariam os feitos alcançados para o incluir nessa restrita lista de notáveis. Nesse sentido, nunca é tarde para recordar os 14 Campeonatos vencidos (8 como jogador; 4 como treinador-adjunto; 2 como técnico-principal), as 8 Taças de Portugal conquistadas (3 como jogador; 1 como técnico-principal; 4 como treinador-adjunto), a Supertaça ganha (na condição de atleta), a presença na final da Taça UEFA de 1983 (como técnico-adjunto) e as participações nos derradeiros confrontos das edições de 1988 (como treinador-principal) e de 1990 (como treinador-adjunto) da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Com o todo arrolado, é o único nome na existência dos "Encarnados" a puder exibir no currículo as conquistas do Campeonato Nacional, tanto como atleta, tal como o homem à frente do corpo técnico.
Mesmo assim e tendo em conta todas as alegrias, Toni viveu alguns momentos polémicos na Luz. Um deles esteve relacionado como o jogo de despedida de Eusébio, do qual foi afastado temporariamente: "Não fui sou eu. Havia mais dois envolvidos: o Humberto e o Nelinho. No treino da véspera, o Jimmy Hagan pediu-nos para saltar os painéis de publicidade. O plantel do Benfica era formado por 30 jogadores e nós os três estávamos no fim do pelotão. Como estávamos em fila indiana e não queríamos saltar todos uns em cima dos outros, o Jimmy Hagan chateou-se e alegou que não fizemos o exercício correctamente. Por isso, não fomos convocados. Nessa noite, o Sr. Presidente Borges Coutinho falou com o treinador e ele lá nos colocou na lista dos convocados para a festa de despedida do Eusébio, cujos bilhetes foram vendidos pelos próprios jogadores do Benfica na Baixa e em outros pontos de Lisboa."*. Outro momento controverso, foi quando, depois do "Verão Quente", onde o Benfica perdeu Paulo Sousa e Pacheco para o Sporting, Toni, apesar do ambiente conturbado vivido na Luz, conseguiu vencer o Campeonato Nacional de 1993/94. Contudo, incompreensivelmente acabou despedido no final da referida temporada, entrando para o seu lugar Artur Jorge.
Muito para além de um exemplo como atleta, Toni é, e será sempre reconhecido, como um ícone do desportivismo. Não faltam casos a servirem de testemunho, mas há dois que fazem parte de todos os anais. O primeiro passou-se num Benfica vs FC Porto, em que, num lance fortuito, lesionou gravemente um adversário - "Nunca quis que aquilo acontecesse, a fractura da tíbia e do perónio. Caminhava para o fim da minha carreira e aquilo abalou-me. Quando vi a situação do Marco Aurélio, não consegui, chorei e pedi para sair."*. Outro episódio ocorreu num "derby" lisboeta a opor as “Águias” ao Belenenses - "A gente não estava a jogar nada mas o árbitro, que se chamava João Nogueira, também estava para embirrar naquele dia. Já tinha expulsado o Malta da Silva e o Torres, o bom gigante. Às tantas, com 0-0 no marcador, apercebo-me que os adeptos da baliza sul, do terceiro anel, começavam a invadir o campo. Disse ao árbitro para entrar no seu balneário e protegi-o (...). Ele escapou de boa, mas ainda levou uns guarda-chuvas nas costas."*.
Por tudo o que aqui relatamos e por tanto que ficou para contar, Toni será, para sempre, um dos notáveis do futebol português e, para os benfiquistas, um dos eternos guardiões da mística “encarnada”.

*retirado da entrevista conduzida por Rui Miguel Tovar, publicada inicialmente no "Jornal i" e republicada a 10/11/2016 em https://observador.pt
**retirado do livro "101 Cromos da Bola", Lua de Papel, de Rui Miguel Tovar (2012)

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