74 - PAULINHO CASCAVEL

Ganhou o apelido a partir da sua cidade natal, mas o veneno com que derrotava os seus adversários, esse, trazia-o no sangue!
Começou no Cascavel CR que, com a sua ajuda e pela primeira vez na história do clube, conseguiu vencer o Campeonato Paranaense, em 1980. Daí até à passagem por clubes de maior peso, foi um instante. Quando, em 1985, chegou ao Fluminense, tendo antes passado por Criciúma e Joinville, Paulinho Cascavel teve apenas que confirmar o seu valor e esperar que, da Europa, surgissem novos convites. Do FC Porto terá saído a proposta mais aliciante, o que fez o ponta-de-lança viajar até às Antas. Porém, a concorrência era muito forte e Fernando Gomes não deu qualquer oportunidade ao recém-chegado avançado.
De “Dragão” ao peito jogou apenas uma partida, suficiente para sagrar-se campeão nacional. Falhada essa etapa, viu-se envolvido na transferência do guarda-redes Best, do Vitória de Guimarães para o FC Porto. Rumou à “Cidade Berço” e, já no novo clube, a sua carreira ganhou novo fôlego. Logo na primeira época atingiu a brilhante marca de 25 golos. No Minho mostrou-se, mais uma vez, como um avançado que sabia fazer golos. Através de potentes remates de longe, em livres directos precisos ou, pelo apurado sentido posicional, ao encostar a bola às malhas, Paulinho Cascavel começou a fazer golos de toda a maneira. A temporada seguinte, a melhor nos vimaranenses, acompanhou uma, também grandiosa, campanha do clube. A equipa orientada pelo treinador Marinho Peres, atingiu o 3º lugar no Campeonato Nacional e na Taça UEFA chegou aos honrosos quartos-de-final. A tudo isso, o avançado juntou o título de Melhor Marcador do Campeonato. O troféu só conseguiu confirmá-lo na última jornada. À partida para a derradeira ronda, o ponta-de-lança encontrava-se empatado com Fernando Gomes e ao marcar em Alvalade, num empate a uma bola, conseguiu sair vencedor.
Com as boas prestações no Minho, voltaram os convites dos “grandes”. Dessa vez a escolha recairia no Sporting. Em Alvalade, com a árdua tarefa de fazer esquecer Manuel Fernandes, Paulinho Cascavel não desiludiu. Logo no ano de estreia revalidou o lugar cimeiro na lista de Melhores Marcadores do Campeonato e conquistou o título de Goleador Máximo na Taça dos Vencedores das Taças.
Envergou durante 3 anos o emblema leonino. Durante a sua passagem por Alvalade apenas conquistou uma Supertaça Cândido de Oliveira. Dizem que por razão de um conflito com o Presidente Sousa Cintra, Paulinho Cascavel decidiu abandonar o Sporting. Em 1990/91 ainda ingressou no Gil Vicente, mas para ficar apenas uma temporada.
Decidiu, então, ser a altura certa para terminar a sua caminhada como futebolista. Após o final da carreira, manteve-se ligado à modalidade. Primeiro, fundou uma “escolinha” de futebol. Depois, já em 2006 e em sociedade com o antigo internacional brasileiro Beletti, comprou o clube da sua terra, o Cascavel CR.

73 - GOMES

Seria engraçado constatar quantos terão sido aqueles que no primeiro instante, mostraram logo a sua estrela de campeão… Estávamos em 1974, Estádio das Antas, e o jogo contra a CUF perfilava-se árduo. Entrava em campo, estreando-se com a camisola principal do FC Porto, um jovem de seu nome Fernando Gomes. O ar imperturbável não deixava adivinhar que contava apenas com 17 anos; a tranquilidade que exibia escondia que, ainda há pouco tempo, jogava pelos juniores… Nada, nada impediu que, nessa tarde, o avançado brilhasse e que fossem dele os 2 golos da sua equipa.
Gomes, à custa da enorme qualidade futebolística, facilmente cimentou um lugar no onze “azul e branco”. Nesse sentido, só os mais distraídos é que ficaram admirados quando, na temporada de 1976/77, o atacante venceu o primeiro de 6 prémios como o Melhor Marcador do Campeonato Nacional. Também a nível colectivo, os títulos ajudaram o ponta-de-lança a cimentar o seu sucesso. Sem sombra de dúvida, um dos grandes impulsos na sua carreira, foi sido a conquista do bicampeonato de 1977/78 e 1978/79.
Curiosamente, terá sido na sequência desse duplo feito, e que, para o FC Porto, quebrou um jejum de 19 anos sem ganhar o Campeonato, que Fernando Gomes viveu uma das maiores polémicas da sua carreira. Ora, seria já no final da época de 1979/80 que Américo de Sá decidiria despedir José Maria Pedroto e Jorge Nuno Pinto da Costa. Por não gostar da linguagem utilizada por ambos sobre o insinuado “poder de Lisboa”, o Presidente dos “Dragões” acabaria por dispensar o treinador e o dirigente máximo para o futebol. Começava assim o “Verão Quente e, nas Antas, grande parte do plantel sairia em defesa dos elementos afastados. No caminho para o saneamento do problema, alguns dos jogadores seriam colocados noutros emblemas e o avançado, estrela maior do conjunto portista, acabaria transferido para o Sporting Gijon.
Apesar da estreia auspiciosa pelo emblema asturiano, com 5 golos marcados ao rival Oviedo, o resto da sua estadia em Espanha, por razão de uma grave lesão, não correria como esperado. Voltaria ao FC Porto, para a temporada de 1982/83. Em boa hora o faria, pois nesse ano, na sequência de ter conseguido sagrar-se no Melhor Marcador de todos os Campeonatos europeus, Fernando Gomes venceria a sua primeira Bota d’Ouro. Repetiria o feito na época de 1984/85. Porém, não só de êxitos individuais viveria o avançado, depois do seu regresso às Antas. O ponta-de-lança faria parte da geração que, para além levar o FC Porto à final da Taça dos Vencedores das Taças de 1984,  conquistaria a Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1987, a Supertaça Europeia e a Taça Intercontinental do ano seguinte.
Sem que ninguém conseguisse adivinhá-lo, para o goleador o fim como atleta do FC Porto estava a aproximar-se. Tomislav Ivic, contratado depois da conquista de Viena, diria que, para ele, Fernando Gomes estava acabado. O jogador, que já tinha sofrido o desgosto de, por lesão, não poder participar na final de Viena, sofreria mais uma desfeita ao ver o técnico Jugoslavo a tirá-lo a meio do jogo da 2ª mão da Supertaça Europeia, impedindo que, na condição de “capitão” pudesse erguer o troféu. Como resposta, o público, que nutria pelo avançado uma grande estima, haveria de, num coro de assobios, vaiar a decisão e, principalmente, o treinador.
Ivic acabaria por, mais tarde, abandonar o clube. Já a chegada de Quinito parecia querer repor o estatuto do avançado. Porém, Gomes, numa altura em que Artur Jorge já era o treinador “azul e branco”, voltaria a envolver-se numa grande polémica. Numa deslocação à Madeira, por via dos atrasos com o avião, o jantar acabaria por começar a horas tardias. Vendo que os dirigentes e equipa técnica estavam a ser servidos primeiro que os jogadores, Fernando Gomes, na altura o “capitão”, insurgir-se-ia contra tal prioridade. Nisso, instalar-se-ia uma grande discussão com o adjunto, Octávio Machado. Resultado, processo disciplinar para o jogador e suspensão de todas as actividades.
No final dessa época Fernando Gomes decidiria não renovar contrato e assinaria pelo Sporting. Em Alvalade, longe do fulgor de outrora, jogaria ainda por 2 épocas. Finda a ligação com os “Leões”, e sem nenhum título a acrescentar ao seu palmarés, ao atleta chegariam propostas de outros clubes. As ofertas acabariam rejeitadas e, desse modo, terminaria a carreira de um dos melhores avançados de sempre do futebol português.

72 - JORDÃO

No final dos anos 60, numa altura em que restavam apenas resquícios da geração bicampeã europeia, chega de Angola, do Sporting de Benguela, um jovem rapaz para jogar nos juniores do Benfica. Pouco tempo após juntar-se aos pupilos orientados por Ângelo Martins, ouviu dizer-se que de África tinha chegado um novo Eusébio. Talvez houvesse algum exagero nesse vaticínio, mas a velocidade, a agilidade felina e a frieza que mostrava na cara do golo, revelavam potencialidades acima da média.
Terão sido essas capacidades que, um ano após o seu ingresso no clube, e com apenas 19 anos, levaram Jimmy Hagan a chamá-lo à equipa principal. Em 5 anos ao serviço das "Águias", conheceu a glória e também a tristeza das lesões – "A primeira foi em 1974, num Benfica - F. C. Porto, no Estádio da Luz, num lance disputado com o Gabriel: tropecei no calcanhar dele, caí desamparado, de tal forma que fiquei com a perna dobrada para trás"*. Porém, Jordão nunca foi de virar a cara à luta. E se essa época ficou arruinada, logo na seguinte o avançado ergueu-se e correu para sagrar-se no Melhor Marcador do Campeonato Nacional.
Nas épocas ao serviço do Benfica ajudou a vencer 4 Campeonatos e conquistou o desejo de outros clubes em tê-lo no seu plantel. Em 1976 foi para o Zaragoza. Porém, o ano que aí esteve em nada foi feliz. Primeiro, foi o estranho e negativo aval dado pelo médico do clube, o qual o Presidente decidiu ignorar. Depois viriam as tricas de balneário – “De facto, acabei por não ser feliz em Espanha, mas isso não se deveu a limitações físicas, deveu-se às dificuldades criadas pelas intrigas e invejas de um paraguaio chamado Arrua, que temeu que eu o ofuscasse e começou logo a infernizar-me a vida"**.
Voltou a Lisboa, mas ao ver recusado ao seu intento de regressar à “Luz”, foi para Alvalade. Com as cores do Sporting fez parte, com Manuel Fernandes e António Oliveira, de um dos trios atacantes mais temíveis da Europa. Terá, nessas 9 épocas leoninas, tido o apogeu como jogador de futebol. No entanto, aos títulos de Melhor Marcador e de Melhor Jogador do Ano, ambos alcançados em 1980, só conseguiu, em 1979/80 e 1981/82, juntar 2 títulos de Campeão Nacional.
Na selecção a sua ascensão foi igualmente precoce. Ia na primeira temporada como profissional, quando, em Março de 1972, José Augusto chama o avançado para o jogo frente a Chipre. Nos quase 17 anos em que representou Portugal, marcou 15 golos. Talvez os mais importantes estejam ligados ao Euro 84. No derradeiro jogo da Qualificação, frente à URSS, foi ele que, depois de uma grande penalidade "fabricada" por Chalana, converteu o castigo máximo e selou o apuramento. Já na fase final da competição, numa partida de má memória, foram dele os dois golos na meia-final que, por 3-2, Portugal acabou por perder para a França.
Há ainda, na sua carreira, outro momento caricato e relacionado com a selecção. O episódio passou-se já na fase descendente da sua carreira e à beira da participação de Portugal no México 86. Ora, com uma boa ponta final de temporada, a hipótese de Jordão ser convocado para o certame começou a ser veiculada. Porém, tal não aconteceu. Dizem, que com o desgosto decidiu "pendurar as botas". Não demorou muito tempo a repensar a decisão e passado um ano de inactividade, regressou, para mais 2 épocas, ao serviço do Vitória de Setúbal.
Em 1989 retirou-se dos campos e, definitivamente, do futebol. Voltou a estudar; formou-se em Belas Artes e dedica-se agora, com a mesma mestria com que antes pintava os golos, a criativas composições nas telas.

*retirado do artigo publicado em http://armazemleonino.blogspot.com, a 14/01/2009
**retirado do artigo publicado em http://futebolandotramagal.blogspot.com, a 26/08/2008

71 - YAZALDE

Um dia foi assistir ao treino de um amigo seu, num pequeno clube de Buenos Aires, o Piraña. Como era oriundo de classes desfavorecidas e daquilo que ganhava como vendedor de bananas, não sobrava nada para a compra de um equipamento, teve que, no mesmo dia em que foi desafiado a prestar provas, pedir roupas emprestadas. Porém, nem esse pequeno incidente teve peso na hora de cativar os responsáveis pelo clube. Terminadas as provas, e fascinados com a sua habilidade, logo deram a Yazalde um contrato para assinar.
A sua ascensão foi rápida. Tinha apenas 20 anos, quando num torneio de futebol, o presidente do Independiente reparou nos seus dotes goleadores. A oportunidade para ir jogar num dos históricos da Argentina, foi-lhe dada logo ali. Já no novo clube, demorou pouco tempo até chegar à primeira equipa. Ainda a jogar pelas “reservas”, o técnico brasileiro Osvaldo Brandão, ao ver no ponta-de-lança enormes qualidades, logo chamou o atleta para equipa principal.
Na temporada de estreia, feito que repetiria 3 anos depois, Yazalde tornou-se campeão. Contudo, a referida revalidação tomou contornos de maior importância. Em 1970, numa altura em que o seu peso na equipa era incontestável, o avançado foi a figura central do título ganho. Ao sagrar-se Melhor Marcador da Prova, os seus golos foram fulcrais. Ainda assim, houve um que ficou na memória de todos os adeptos. Nos últimos minutos da derradeira jornada, onde só uma vitória interessava, foi dele o tento que acabou por desempatar a partida frente ao Racing Avellaneda e por dar o troféu aos escaparates do Independiente.
No rescaldo da prova, apesar da alegria, outra preocupação assolou o espírito dos dirigentes do Independiente. Yazalde estava nos últimos dias de contrato e o mérito das suas exibições permitiam a cobiça de outros emblemas. Valência, Lyon, Nacional de Montevideu, Santos, Palmeiras e Boca Juniores disputaram os seus serviços. No entanto, seria o Sporting, após uma investida relâmpago, a contratá-lo. Com isso chegava a Lisboa um avançado que, ao contrariar o típico jogador sul-americano, não era de finta fácil e bola no pé. Por outro lado, a sua agilidade, o sentido posicional e uma entrega inabalável, haviam de tornar-se míticas. Nos 4 anos em que vestiu a camisola leonina, fez-se num símbolo do clube. A sua primeira época não terá sido espantosa, mas daí em diante foi sempre em ascensão. Em 1973/74, para juntar à vitória no Campeonato Português e ao título de Melhor Marcador com 46 golos, Yazalde também ganhou o seu lugar no rol dos ilustres vencedores da Bota d'Ouro.
Ainda pelo Sporting, havia de conseguir terminar a temporada de 1974/75, na posição cimeira da tabela dos Melhores Marcadores do Campeonato. Foi a sua última época em Portugal. Em seguida, seguiu para França e para o Olympique de Marselha. Todavia, as suas prestações, ainda que boas, já não voltaram a ter o brilhantismo que tinham levado o atleta ao estrelato e ao Mundial de 1974. Passadas 2 épocas voltou ao país natal. Regressou para representar o Newell's Old Boys e, depois de 4 campanhas, o Huracán.
É certo que as marcas, os golos e as vitórias dão contornos de heroísmo à vida dos homens do futebol. Contudo, não é menos verdade que aquilo que mostram fora das 4 linhas, muito mais do que as conquistas dentro delas, é o mais importante dessas memórias. O “Chirola”, na sua generosidade, tornou-se numa dessas saudosas lembranças. Como exemplo, temos a história do carro ganho com a conquista da Bota d’Ouro. Ao querer premiar todos os seus colegas pelo feito conseguido, Yazalde pôs o automóvel à venda. Ao dinheiro conseguido, dividiu-o e ofereceu-o aos companheiros de balneário, pois, como terá querido dizer, a glória é de todos.

70 - TORRES

Filho de Francisco Torres, jogador do Carcavelinhos, e sobrinho de Carlos Torres, extremo do Benfica, José só poderia sair aos seus. E saiu, mais do que a conta!
Começou no clube da sua terra, o Torres Novas, onde, em 2 épocas, marcou 105 golos. Tal concretização valer-lhe-ia a passagem para o Benfica, onde conseguiria estrear-se com 20 anos. Porém, seriam precisas mais 3 épocas para que conseguisse impor-se de “Águia” ao peito. O tempo era de José Águas e destronar o “capitão” não foi fácil. O treinador chileno Fernando Riera deu-lhe essa oportunidade. O início, mais porque substituía uma das grandes glórias do Benfica, do que falta de qualidade, não foi fácil. Apesar de contestado, aos poucos foi merecendo o respeito dos adeptos e, ao fim de alguns meses, José Torres já era exaltado como qualquer uma das estrelas benfiquistas.
Em campo, o seu 1,91m de altura e um jogo de cabeça mortífero, começaram a impor respeito. O seu carácter e "fair-play" também conquistaram adversários e os verdadeiros apreciadores do futebol. Ganhava assim o epíteto de "Bom Gigante". Partilhou as pelejas futebolísticas com outras “estrelas” da altura. Eusébio, Simões, Mário Coluna, José Augusto, entre outros, ajudaram-no a potenciar as suas capacidades e a demolir as defesas adversárias. No rescaldo de uma gloriosa carreira ficaram a conquista de 9 títulos nacionais, o primeiro lugar na tabela dos Melhores Marcadores de 1962/63, a presença no Mundial de Inglaterra em 1966, e as 3 finais da Taça dos Clubes Campeões Europeus.
Em 1971, José Torres viu-se envolvido na transferência de Vítor Baptista para o Benfica. Rumou à cidade do Sado e ao Vitória de Setúbal, com a mesma valentia de sempre. A vontade que impelia ao esférico permaneceu intacta e as bolas continuaram a invadir as redes adversárias, com uma precisão aterradora. Tal força, dificilmente igualável, foi premiada com mais 2 chamadas à selecção portuguesa. Ainda vestiu a camisola do Estoril Praia e ao serviço do clube da Linha de Cascais, deu por terminada a carreira de futebolista.
Já como treinador, voltou a abraçar a glória no futebol. Quando, antes do jogo com a República Federal Alemã, fulcral na qualificação para o Mundial de 1986, disse "deixem-me sonhar", José Torres, mais do que ninguém, acreditou ser possível o apuramento. Naquela noite fria de Estugarda, o homem que 20 anos antes tinha saboreado a glória de uma fase final, deu aos seus pupilos do mesmo inebriante "vinho". Torres mostrou que um onírico crer terá sempre forças para derrotar todas as quimeras e, com essa verdade, levou Portugal ao Campeonato do Mundo realizado no México.

69 - MATATEU

Jogava no 1º de Maio de Lourenço Marques, filial do Clube Futebol "Os Belenenses" em Moçambique, um avançado possante que diziam marcar muitos golos. Nisso, às Salésias começariam a chegar as notícias do seu valor e, na “casa mãe”, quiseram saber mais sobre o tal atacante. A viagem foi marcada. As passagens compradas e todas as despesas pagas. No entanto, a pressa, ou o medo de que um dos rivais desviasse o craque foi de tal ordem, que a viagem de barco foi trocada por uma de avião!
A Lisboa chegava Matateu, corria o ano de 1951. Como já contava 24 anos, a desconfiança dos adeptos sobre o real valor de um jogador que tarde tinha despontado, começou a surgir. Porém, a dúvida demorou pouco tempo a esfumar-se. Logo à 1ª jornada do Campeonato de 1951/52, o avançado haveria de marcar 2 golos na vitória do Belenenses por 4-3, frente ao Sporting dos “5 Violinos”. A multidão, endoidecida pela estrondosa exibição, invadiria o campo para, no final do jogo, carregar em ombros a sua nova estrela.
Outros momentos inesquecíveis não demorariam a aparecer. Bastou mais 1 época para que conseguisse sagrar-se, pela primeira vez, no Melhor Marcador do Campeonato, com 29 golos. A proeza voltaria a repetir-se passados 2 anos, dessa feita com 31 remates certeiros. Contudo, as suas maiores façanhas, e que acabariam por projectá-lo como uma estrela internacional, terão ocorrido em 1955. Em Maio do referido ano, no Estádio do Jamor, e na sequência da primeira vitória de Portugal sobre a Inglaterra, escreveriam assim num tablóide britânico: “Fomos derrotados por essa oitava maravilha que rebaixou e humilhou uma Inglaterra destroçada e inebriada. E não há justificação porque, com excepção do maravilhoso Matateu, o grupo português é uma equipa de passeantes com apenas uma vitória em 19 jogos”*. Ainda nesse ano, em Paris, na disputa de mais uma edição da, à altura muito prestigiada, Taça Latina, mais um louvor. Ao passar à frente de “galácticos” como Di Stefano ou Puskas, o avançado veria o seu nome ser eleito como o melhor atleta da competição.
Doze anos após ter chegado, já com 36 anos, veria o treinador Fernando Vaz a inscrevê-lo no rol de atletas dispensados. Apesar de descontente com a despromoção às “reservas”, acataria, com todo o brio, as decisões tomadas. Mesmo depois do técnico ter sido despedido, Matateu achou que seria melhor despedir-se do Belenenses. Saiu sem nunca ter sido campeão e, apenas, com 1 Taça de Portugal no currículo.
Porém, a vontade de jogar ainda não tinha acabado. Os últimos anos da carreira passá-los-ia em clubes de menor monta. Atlético, Amora, Gouveia e Desportivo Chaves marcariam a derradeira fase de uma caminhada que, no Canadá, terminaria aos 55 anos. Longa a vida de um dos mais letais avançados portugueses que, como diria um dia Artur Quaresma, seu antigo treinador – "Equipas como Sporting, FC Porto e Benfica marcavam-no homem a homem, num tempo em que nem se pensava nessas modernices"*.

*retirado do artigo de Rui Tovar, publicado no “Jornal i”, a 27/01/2010

68 - JOSÉ ÁGUAS

É o capitão que ergueu as 2 Taças dos Clubes Campeões Europeus vencidas pelo Benfica... Mas a história deste avançado começa muito antes!
Corria o ano de 1950 e uma digressão de início de época leva o Benfica, acabado de vencer a Taça Latina, a deslocar-se a Angola. O jovem José Águas, com 19 anos, jogador do Lusitano do Lobito e dactilógrafo numa empresa concessionária da Ford, é chamado para defrontar a equipa vinda da metrópole. No campo, o Benfica acabaria por encaixar uma derrota por 3-1 frente à selecção do Lobito. Já o treinador Ted Smith sairia a ganhar!
No rescaldo do encontro, o técnico inglês pede ao avançado-centro que tinha acabado de marcar 2 golos à sua equipa, para ir até ao hotel onde as “Águias” estavam instaladas. Falaram e nem o assédio do FC Porto, posto em marcha no dia seguinte ao da reunião, demoveu o atleta do acordo já feito. José Águas acabaria por fazer o resto da "tournée" com os “Encarnados”. Daí, partiria com a equipa do seu coração, para vir a fixar-se em Lisboa.
O começo não terá sido muito auspicioso. Houve quem dele desconfiasse e pusesse em causa o seu valor. Porém, José Águas não demorou muito a dar uma resposta a todos os críticos. Ao exibir os exímios dotes que fariam dele um dos mais elegantes cabeceadores do futebol luso, marcou 4 golos logo à 2ª jornada do Campeonato. Com a vitória por 8-2 frente ao Sporting de Braga, as dúvidas ficaram desfeitas. Daí em diante a sua carreira fez-se apenas de grandes sucessos e faustosos números. Entre esse dados, temos as 2 vitórias na Taça dos Clubes Campeões Europeus; os golos marcados em ambas as finais; a conquista do título de Melhor Marcador na primeira dessas 2 edições; os 5 Campeonatos Nacionais e as 7 Taças de Portugal ganhas; e, por fim, os 5 troféus como Melhor Marcador do Campeonato Nacional.
A saída de Béla Guttmann, pelo qual tinha uma admiração muito especial, e a entrada de Fernando Riera, marcou o fim da sua ligação ao Benfica. Passadas 13 épocas de “Águia” ao peito, e ao ver-se relegado para o banco de suplentes, o capitão decidir-se-ia pelo adeus. Aceita ainda o convite do FK Austria Wien, onde joga apenas uma época. Mas nesse seu percurso desportivo, serão os 384 jogos e 379 golos feitos ao serviço dos “Encarnados”, que, para sempre, marcarão a história daquele que uma vez chegou dizer que vestia o equipamento com “mesmo espírito com que o operário veste o fato-macaco”*, até porque “não gostava de jogar à bola”*. Curioso discurso para quem mostrou sempre uma enorme entrega!

*retirado do livro “Memorial Benfica – 100 glórias”, de João Malheiro

67 - ARAÚJO

O ocaso de uma das maiores estrelas portistas coincidiu com o aparecimento de outro dos icónicos futebolistas do FC Porto. Decorria o ano de 1942, estava Pinga já nos últimos anos de carreira, quando, por aquelas bandas, surge um jovem para ser avaliado. Tão boas foram as impressões deixadas que, com 19 anos apenas, Araújo é imediatamente indicado para a equipa principal.
Apesar da sua rápida ascensão e da confirmação de todo o seu génio como um dos mais eficientes goleadores portugueses, os títulos colectivos nunca surgiram à medida do seu talento. O FC Porto, ao atravessar uma fase deveras complicada, ficou arredado da conquista do Campeonato Nacional durante 15 anos. Mesmo assim, em 1947/48, lutando contra o domínio dos 3 clubes de Lisboa, Araújo, ao concretizar 36 golos em 26 jogos, conseguiu sagrar-se no Melhor Marcador do Campeonato Nacional.
Claro que os momentos de glória não ficaram por aqui. Um dos mais emblemáticos terá sido aquando da primeira vitória oficial frente à Espanha. O Estádio Nacional, recentemente inaugurado, recebeu o aguardado embate ibérico. Dessa feita, contra todas as previsões, 2 golos de Travassos e 2 de Araújo, deram a vitória à Selecção de Portugal, por 4-1. Na sua terra natal, Paredes, foi recebido como um herói. Foguetes, fanfarra e uma multidão em delírio, culminaram com uma condizente recepção nos Paços do Concelho.
A sua presença na selecção caracterizou-se de forma marcante. A certa altura e por ser o único convocado do FC Porto entre a maioria de atletas do Benfica, Tavares da Silva, o seleccionador, disse que Portuga poderia chamar-se Sport Lisboa e Araújo.
Estava no auge quando um grave revés dilacerou a sua carreira. Um problema infeccioso acabaria por tirá-lo dos campos, durante 2 anos. Recuperou e ainda regressou à actividade futebolística com as cores do FC Porto. No entanto, a doença tinha debilitado o jogador ao ponto de, em nada, haver semelhança com aquilo que os adeptos tinham na memória. Decidiu-se pelo afastamento. Na merecida festa de despedida, reuniram-se os melhores. Peyroteo, que já estava retirado, juntou-se à homenagem. Araújo emocionado, em lágrimas e com os filhos ao colo, agradecido pelo gesto do "violino", ofereceu-lhe a medalha que o FC Porto tinha, propositadamente, gravado para si.
Mas o gosto pelo futebol era tanto que não resistiu. Primeiro no Tirsense, depois no União de Paredes, Araújo voltou a fazer "o gosto ao pé". Passou a conciliar o desporto com o seu emprego na Câmara Municipal de Paredes e com outra paixão... a columbofilia!

66 - PEYROTEO

É considerado por muitos o melhor avançado-centro de sempre do futebol português. Se foi ou não o maior, ser-me-á difícil discuti-lo. Porém, e verdade seja dita, os números não deixam muitas duvidas e será fácil chegar à conclusão que Peyroteo terá sido um grande goleador. Vejamos: em 12 anos marcou à volta de 700 golos; detém o recorde de golos numa só partida para o Campeonato, 9 nos 14-0 ao Leça; foi 6 vezes o Melhor Marcador do Campeonato Nacional; e, com mais de 1,6 golos/jogo, é o detentor do recorde mundial para a melhor média de golos conseguidos durante a carreira, em campeonatos nacionais.
Não foi só os golos que se tornaram Peyroteo num exemplo. Vários são os episódios que aferem a rectidão deste homem. Acabado de chegar de Angola, onde representava o Sporting de Luanda, e ainda sem ter contrato assinado, consta que um emissário do FC Porto tê-lo-á abordado e oferecido condições mais vantagens. Recusou, pois já tinha dado a sua palavra aos “Leões” e nunca a trairia. Anos mais tarde, terá sido também assediado pelo rival Benfica e pelos franceses do Bordeaux, mas a fidelidade e paixão pelo seu clube era tal que, novamente, recusou as vantajosas propostas.
Só no último ano da sua brilhante carreira, abandonou o emblema “verde e branco” e vestiu a camisola do Belenenses. No entanto, a sua imagem ficará para sempre ligada ao Sporting, seja pela sua estreia, onde marcou 2 golos na vitória por 5-3 frente ao Benfica; seja por ter feito parte de uma das mais famosas linhas de ataque, "Os Cinco Violinos"; seja pela admiração e saudade que deixou nos corações leoninos.
A devoção à sua pessoa chegou a ser tanta que, por graça, e também em alusão à rivalidade que mantinha com um tal avançado das “Águias”, era costume ouvir-se da boca dos sportinguistas: "Em nome do pai, e do filho e do Peyroteo, que o Espírito Santo é do Benfica!"

65 - PINGA

Terá sido uma copiosa derrota por 7-1 no Funchal, frente ao Marítimo, que fez com que o FC Porto virasse a sua atenção para um atacante do emblema madeirense, que parecia fazer o que queria da bola. Esse jogador chamava-se Artur de Sousa, “Pinga” de alcunha.
A vontade de trazê-lo para a “Cidade Invicta” foi de tal ordem, que os dirigentes do FC Porto não viram qualquer problema quando a transferência começou a entrar por certos atalhos obscuros. Depois de algumas trapaças, falsificações de documentos e outras patifarias, Pinga passou a vestir de “azul e branco”!
Já no Porto, trapalhadas à parte, demorou pouco tempo até o avançado revelar a sua magia. A sua maneira tecnicista sobressaiu; a dedicação ao jogo também nunca foi descurada; a sua disciplina fazia com que, com o mesmo afinco com que atacava e passava um adversário, voltasse a correr para a defesa da sua baliza. Nessa senda crescente, a glória da primeira chamada à Selecção Nacional chegou quando contava 21 anos. Apesar da derrota frente à Espanha, a sua exibição foi de tal forma marcante que todos os jogadores adversários, para além de apelidarem o avançado como talentoso, acabaram a peleja a aplaudir o seu desempenho.
A sua fama começou a transpor fronteiras e a confirmação do seu talento chegou quando ele, Valdemar Mota e Acácio Mesquita destroçaram o First de Viena. A exibição frente àquele que era visto, à altura, como o “Dream Team” europeu, fê-lo andar nas bocas do mundo. Com a partida a realizar-se perto da hora de almoço, o desempenho do trio ofensivo foi de tal modo arrebatador, que acabou por ficar conhecido como "Os Três Diabos do Meio-Dia".
A propósito dessa e de outras exibições, Pinga chegou a dizer: "Nós os três... Aquilo é que era jogar... Que desculpem a vaidade, mas parece-me que nunca mais se arranjam três rapazes da bola tão intimamente ligados a acertar na borracha. Se até nós, às vezes, nem sabíamos como aquilo era..."*.
O avançado retirou-se já tinha passado os 36 anos. A idade já pesava e uma lesão num menisco, operada meses antes, ajudou na sua decisão. A despedida foi apoteótica e a 7 de Julho de 1946, por entre grande comoção, aplausos de pé e gritos entoando o seu nome, Pinga, arrebatado pela homenagem que estavam a prestar-lhe, abandonou o Estádio do Lima com os olhos lavados em lágrimas.

*retirado do artigo publicado em https://estrelas-do-fcp.blogspot.com, a 24/03/2008

GOLEADORES

HERÓIS

da derradeira vontade de um anseio comum
e no intrépido querer de o exaltar
num campo edificado em delírio
soberbos
erguem-se como os estandartes que os festejarão
manifestando-se no ostensivo golpe da impiedade
glorificados
serão
na eternidade d'uma alma em flama
o pecado original
perdoado

... e assim iniciamos o mês de Novembro, todo ele dedicado aos GOLEADORES, melhores marcadores em Portugal!!!!


Ver também: Goleadores, parte II; Domingos; Eusébio; Falcao; Hulk e Hulk (II); Jackson M.; Jardel; Liedson; Magnusson; Meyong