449 - FOLHA

Terminamos este mês dedicado aos antigos jovens que, em 1989, conquistaram o título mundial sub-20, com um dos jogadores que, dentro do lote convocado para a Arabia Saudita, mais sucesso conseguiu alcançar como desportista profissional. Perguntarão: então o João Pinto, o Paulo Sousa e o Fernando Couto? Bem, é indiscutível que todos esses nomes são casos paradigmáticos de futebolistas que figurarão, para sempre, nos anais do desporto português. No entanto, o que dizer de um jogador que conseguiu como sénior, nada mais, nada menos, do que 14 títulos e um total de 26 internacionalizações pela selecção principal portuguesa?!
Folha cumpriu quase toda a carreira ao serviço do FC Porto. Fez parte do melhor período da história "azul e branca", o conhecido "Penta", de onde, aliás, conseguiu 5 dos 6 Campeonatos Nacionais que contam no seu currículo. Claro está, como a maioria dos jovens que surge da formação, o antigo extremo-esquerdo passou os primeiros anos da carreira na normal roda-viva dos empréstimos. Entre o Gil Vicente, o antigo Estádio das Antas e, mais tarde, o Sporting de Braga, António Folha ganhou a necessária estaleca para conseguir vencer num emblema tão exigente quanto o do "Dragão". O regresso à "casa mãe" deu-se, em definitivo, no Verão de 1993. Contudo, apenas a partir da temporada seguinte, ano em que arrancou a senda do referido "Penta", conseguiu agarrar a titularidade do lado canhoto do ataque portista. A regularidade apresentada fê-lo tornar-se numa das presenças habituais na convocatória da "Equipa das Quinas" e não foi de todo estranho a sua inclusão, chamado por António Oliveira, na lista dos participantes do Euro 96.
A verdade é que o torneio disputado em Inglaterra, estranhamente, marcou para o atacante um momento de viragem na sua vida como atleta. No FC Porto começou, inicialmente, por perder o lugar no "onze". Um par de anos depois passou a participar pouco nos planos dos treinadores. Até que, corria a época de 2000/01, acabou mesmo por deixar a "Cidade Invicta". Iniciou, então, um périplo por outros campeonatos europeus. Jogou na Bélgica ao serviço do Standard Liège e na Grécia veio a vestir as cores do AEK de Atenas. Ainda nesse rumo, após voltar a Portugal, Folha terminou a carreira com a camisola do Penafiel. Imediatamente, ainda no clube duriense, trocou as chuteiras pelas funções de treinador. Foi já nessas tarefas que regressou ao FC Porto. Começou por ocupar funções nas “escolas” dos "Azuis e Brancos" e hoje em dia (2013/14) é um dos adjuntos da equipa B portista.

448 - FILIPE

Dos que fizeram parte do grupo campeão do mundo na Arábia Saudita, já falamos de um jogador cuja origem não remonta a nenhum dos ditos 3 “grandes". Tal como Tozé, também Filipe começou por furar essa barreira, essa dificuldade que é estar presente nas selecções sem pertencer a uma das principais montras do futebol português. Ainda assim, conseguiu viver de uma sorte um pouco diferente da do antigo capitão que, em 1989, ergueu o referido troféu. O médio, depois do título mundial conseguido pelos sub-20 lusos, viu o Sporting a apostar nele para a temporada de 1989/90. Os "Leões" acabavam de entrar na era Sousa Cintra e o jovem atleta, ao deixar o Torreense, tornou-se numa das primeiras contratações do antigo presidente dos “Verde e Brancos”.
Numa equipa cheia de craques, há algo que qualquer treinador gosta de ter, isso é, "músculo". Foi isso mesmo que o médio-defensivo veio trazer a Alvalade; foi isso que sempre o caracterizou; foi essa a sua maior força. Por essa razão, logo na sua segunda época a envergar o listado leonino, acabou a merecer a titularidade. A raça demonstrava em campo, um intrínseca disponibilidade física, facilmente conquistou os seus treinadores. Marinho Peres e Sir Bobby Robson sempre mostraram o gosto que tinham pelo jogador, dando-lhe a confiança de um lugar no "onze" inicial. Acima disso, se é que ser titular no Sporting pode ser tido como pouco, vieram as convocatórias para a selecção principal de Portugal. Somou 3, o que era um bom prenuncio para sua carreira. Contudo, as lesões começaram, desde muito cedo, a atormentar o jovem futebolista. Afastaram-no da equipa já com Carlos Queiroz ao leme do Sporting e, a bem da verdade, conjuntamente com um feitio um tanto ao quanto irreverente, deixaram-no à margem de uma carreira que poderia ter sido substancialmente maior.
Em 1996/97 deixou o emblema Lisboa. Não saiu de mãos a abanar, já que na bagagem levou a Taça de Portugal de 1994/95 e a Supertaça do ano seguinte 1995/96. No entanto, desde a partida para o Marítimo que a sua carreira tomou os contornos de uma vida nómada. Daí em diante, quase todos os Verões eram para Filipe sinónimo de nova morada. Passou pelo Vitória Sport Clube, Desportivo de Chaves, Naval, acabando por mergulhar, apenas com 30 anos, nos escalões amadores.
Após o Atlético, surgiu na sua vida o Mafra. Muito para além de por aí ter “pendurado as botas”, o clube saloio marcou um ponto de viragem para Filipe. Um convite da direcção levou-o a trocar os relvados pelo comando técnico. No "banco", depois de ter estado ligado ao Sporting, onde fez parte do plano de cooperação que os "Leões" assinaram com o Real de Massamá, o antigo internacional "luso" chegou a tomar as rédeas dos destinos das selecções jovens nacionais, cargo que, entretanto, abandonou.

447 - ABEL SILVA

O percurso a levar um grupo de jovens futebolistas a sagrarem-se campeões do mundo é, por si só, o mote certo para uma conversa interessante. No entanto, nessa caminhada houve alguns momentos mais curiosos do que outros. Uma das histórias mais engraçadas passou-se com Abel Silva. Como titular nessa selecção que, em 1989, venceu o Mundial sub-20, o jovem lateral-direito foi um dos escolhidos para disputar a final do torneio. Antes do início da partida agendada para Riade, todos os presentes no relvado do Estádio International King Fahd, acabaram por conhecer um dos grandes astros da história do desporto. Foi então que o defesa, no alto da sua jovem irreverência, decidiu fazer uma promessa – “Antes da final, quando Pelé nos veio cumprimentar, eu disse-lhe que ia marcar um golo à… Péle. Nem sei se ele me ouviu mas sei que viu o meu golo, que foi mesmo um golo à… Péle, sem dúvida maravilhoso”*
Foi com um espectacular e portentoso pontapé à entrada da grande área que Abel Siva veio a tornar-se no primeiro dos marcadores daquele que foi o derradeiro jogo do certame. Esse 44º minuto da primeira parte, até pela vitória no desafio, ficará para sempre na memória colectiva do futebol nacional. Contudo, a carreira de Abel Silva teve um pouco mais do que essa belíssima finalização. Desse modo, ao terminar a formação no Benfica, foi com naturalidade que, na mesma temporada do referido Campeonato do Mundo sub-20, ocorreu a sua transição para a categoria sénior. Com a normalidade inerente às primeiras fases de uma carreira profissional, o jovem atleta pouco foi utilizado. Ainda assim, bastou-lhe uma partida disputada – 1-0, em casa, frente ao Sporting de Braga – para que pudesse erguer o troféu atribuído aos campeões nacionais. As 3 épocas seguintes, em parte devido à forte concorrência dentro do plantel “encarnado”, deram à caminhada do lateral-direito um périplo, a título de empréstimo, pela Académica de Coimbra, Penafiel e Marítimo. Já o regresso à “casa mãe”, apesar de continuar afastado da titularidade, deu-lhe a oportunidade de conquistar mais 2 títulos e de acrescentar ao currículo os triunfos na Taça de Portugal de 1992/93 e na edição de 1993/94 do Campeonato da 1ª divisão.
Com a revolução perpetrada por Artur Jorge na preparação da campanha de 1994/95, Abel Silva tornou-se num dos preteridos do técnico português. Daí em diante começou um trajecto a levá-lo, por entre os principais escalões lusos, a representar uma série considerável de emblemas, edos quais há a destacar Vitória Futebol Clube, Felgueiras, Campomaiorense, Estoril Praia, Alverca e Atlético.

*retirado da revista “A Bola – A Fantástica viagem da Geração de Ouro”, Janeiro 2007

446 - TOZÉ

Ao contrário de tantos outros praticantes que com ele partilhavam o balneário das selecções nacionais, o médio não vinha do Benfica, do Sporting ou do FC Porto. Contudo, tal facto não o diminuía, não o tornava pior que ninguém, nem o impedia de chegar onde os outros também chegavam. Tozé era um "bebé" do Leixões. Dele, tal como a vontade das gentes do mar que, de Matosinhos, sua terra natal, conduz a faina, saía a força para encabeçar toda uma geração de futebolistas. Foi esse legado de coragem a transformar o inocente futebolista no capitão de Portugal, foi essa valentia, que de pequena se fez tão grande, a trazer a inspiração a um grupo de jovens atletas, a fazê-los querer mais, a desejar acrescentar mais vitórias à sua fortuna – “Na altura nem imaginava que era possível chegar a levantar o troféu. Ainda hoje é inacreditável, porque todos continuam a associar-me à imagem do campeão do Mundo que levantou a taça”*.
A campanha de 1988/89, época do referido Campeonato do Mundo sub-20, marcaria para Tozé, após a estreia sénior no ano anterior, o arranque da sua caminhada na 1ª divisão. Num Leixões de volta aos palcos principais do futebol português, os momentos de aprendizagem, em tão exigente contexto, surgiriam como uma enorme oportunidade. No entanto, o que devia ser a normal evolução de uma carreira ainda a dar os passos iniciais, haveria de ser interrompida pela despromoção do clube. Mesmo a viver o revés da descida, o jovem atleta, alimentado por uma ambição natural, saberia tirar partido da situação adversa e acabaria por conquistar a titularidade no grupo matosinhense. Porém, para o médio que, na Arábia Saudita, tinha levantado ao alto, muito mais do que um troféu, o orgulho de um país, a divisão de Honra era pequena demais para os seus sonhos. Apareceria então o plantel de 1992/93 do Tirsense. Prémio justo, é certo. Também não é menos verdade dizer-se que talvez tivesse merecido um pouco mais. Quiçá devesse ter tido a chance de mostrar as suas habilidades em universos de outras montas. Ainda assim, o jogador pode orgulhar-se de ter conseguido atingir metas importantes: ultrapassou, nas 7 temporadas no escalão máximo, os 150 jogos; vestiu, ao mais alto nível, para além das camisolas dos já referidos Leixões e Tirsense, as do Leça e do Alverca; e fechou a sua vida como futebolista, de volta ao listado dos “Bebés”, com a melhor prenda de todas, a presença na final da Taça de Portugal de 2001/02.
Depois do termo da carreira como praticante profissional, Tozé não abandonaria o futebol. Nesse sentido, teria passagens pelo comando técnico de alguns clubes, como o Padroense e o Pedras Rubras e voltaria ao rectângulo de jogo pelos amadores do Custóias. Contudo, o seu verdadeiro objectivo seria cumprido nos livros e nos cadernos da escola, com o antigo internacional a regressar à vida académica e a licenciar-se em Educação Física e Desporto, no Instituto Superior da Maia.

*retirado do artigo publicado a 5/1/2011, em https://desporto.sapo.pt

Ver também a rubrica "Recortes"

445 - VALIDO

Nem todos os jogadores profissionais podem orgulhar-se de um início de carreira tão auspicioso quanto aquele que Pedro Valido teve. Ainda dava os primeiros passos no universo do futebol sénior, quando viu Carlos Queiroz a chamá-lo para o Mundial sub-20 de 1989. Na altura da convocatória, o defesa, por empréstimo do Benfica, representava o Estoril Praia. No entanto, nem o facto de apenas disputar aquele que é o segundo patamar do futebol português, atemorizou o jovem praticante para a demanda a avizinhar-se. A verdade é que, aquando do torneio disputado na Arábia Saudita, do qual saiu consagrado como vencedor, o traquejo do defesa-central, nesse tipo de certames, já era algum. Por exemplo, tinha estado presente, no ano anterior, no Europeu sub-18. Aliás, foi nessa categoria que o atleta fez a estreia absoluta com a "camisola das quinas", numa peleja frente à Republica Federal da Alemanha, disputada a 4 de Novembro de 1987.
Tendo sido para si projectados grandes sucessos, então, o que aconteceu a Valido? É certo que não conseguimos apontar-lhe os mesmos feitos que, daí em diante, muitos dos seus colegas campeões mundiais conseguiram alcançar. As razões, se é que interessam para este singelo texto, podem ter sido tantas, quantas a especulação consegue fabricar. Ainda assim, é fácil descortinar a conjuntura desportiva do Benfica como um factor a pouco ajudar à afirmação de um jovem. Falo somente na concorrência de estrelas como Mozer ou Ricardo Gomes. Ainda assim, o defesa soube talhar-se num craque. Fê-lo numa sinceridade absoluta; fê-lo de uma franqueza a espelhar a maneira apaixonada com que veio a entregar-se às suas missões. O resultado de tudo, de tudo o que quis ser, ficou marcado no seu percurso. Modesto, dirão alguns. Distante daquilo que prometeu, dirão outros. Todavia, o que pergunto é o seguinte: quantos são os que podem afirmar ter alicerçado a maior parte da carreira na 1ª divisão? Pois é… não muitos!
Ora, no que diz respeito ao patamar máximo, o defesa passou por diversos clubes. Destacou-se na equipa do Marítimo que, pela primeira vez na história do emblema insular, conseguiu o apuramento para as provas organizadas pela UEFA. Envergou as cores do Feirense, Gil Vicente, Estrela da Amadora, Tirsense, Belenenses e Alverca. Não conquistou muitos títulos, é certo; não atingiu, também, o mediatismo de tantos outros da sua geração. Contudo, alcançou algo muito mais valioso do que troféus. Conseguiu, no seu trajecto, ganhar a admiração de muitos que com ele privaram; conseguiu aquilo que apenas alguém com um caracter verdadeiramente vertical merece, isto é, o respeito dos seus pares. Por tudo isso, hoje em dia é confiada a Valido outras grandes missões: a de orientar jovens jogadores e, principalmente, a de formar Homens num mundo tão ingrato quanto o do futebol. Nesse contexto, o antigo defesa é um dos treinadores das “escolas” do Benfica.

444 - PAULO MADEIRA

Foi como júnior que Paulo Madeira, vindo do Lusitano de Vila Real de Santo António, chegou ao Estádio da Luz. Em Lisboa acabou a formação e viu o seu nome, por altura do último ano nas “escolas encarnadas", a ser incluído na lista de convocados para o Mundial sub-20 de 1989, realizado na Arábia Saudita. O facto de, no aludido país do Médio Oriente, ter participado em todos os desafios daquela que foi uma caminhada vitoriosa, transformou-se no sinal, mais do que evidente, que o defesa-central tinha valor para, futuramente, singrar nas “Águias”. Com essa ideia em mente, os responsáveis técnicos benfiquistas, nomeadamente Sven-Göran Eriksson, mantiveram o jovem jogador no plantel. Claro está que, como é normal nessas situações, a sua afirmação não foi fácil e o jovem intérprete, na sombra de jogadores como Ricardo Gomes ou Aldair, não teve muitas oportunidades no decorrer das campanhas de 1989/90 e 1990/91.
Com a entrada na época de 1991/92, surpreendentemente nenhum nome sonante acabou anunciado como reforço para o sector mais recuado das "Águias". No centro da defesa, como aposta do já referido técnico sueco, surgiu então Paulo Madeira. Ainda algo inexperiente, a escolha do jogador, ainda por cima para titular, foi vista como um enorme risco. No entanto, o atleta não desiludiu e mostrou, no decorrer das provas agendadas para a campanha mencionada no começo deste parágrafo, uma consistência digna dos grandes nomes a exibirem-se na sua posição. Uma dessas demonstrações, que ficará para sempre na nossa memória, foi o mítico Arsenal/Benfica, disputado em pleno Highbury Park. Ao lado de Rui Bento, outras das jovens promessas saída das “escolas” benfiquistas, o jogador faria um jogo praticamente imaculado, contribuindo para a eliminação dos londrinos e, acima de tudo, empurrando o Benfica para a participação na fase de grupos da última edição da Taça dos Clubes Campeões Europeus.
Depois dessa temporada, quando era esperada a sua afirmação como um dos pilares do “Glorioso”, Paulo Madeira começou a perder algum espaço. Surgiu então o empréstimo ao plantel de 1993/94 do Marítimo, com a passagem pela Madeira a traduzir-se numa boa época. Infelizmente para o jogador, a cedência aos “Leões do Almirante de Reis” impediu-o, com o Benfica a sagrar-se campeão, de juntar tal título às vitórias no Campeonato Nacional de 1990/91 e à Taça de Portugal de 1992/93. Pior ainda emergiu com o termo da campanha da chegada de Artur Jorge aos comandos das “Águias”. Com mais uma purga de balneário perpetrada pelo técnico, um dos nomes indicado, pelo treinador português, para abandonar o clube, foi o do defesa e tal dispensa levou-o para a outra ponta da capital, onde, durante dois anos, envergou a camisola do Belenenses.
No Restelo, o jogador continuou a manter uma qualidade apreciável, motivo suficiente para voltar à órbita das pretensas contratações do Benfica. No entanto, era João Vale e Azevedo quem "reinava" para os lados da 2ª Circular. Escusado será dizer que o regresso de Paulo Madeira à Luz, como em tantas outras histórias ocorridas por essa altura, ficou envolto em polémica. Sem que consiga explicar-vos o cerne das “habilidades” feitas pelo Presidente das “Águias”, mas certo que as mesmas apareceram com o intuito do Benfica nada pagar ao Belenenses, o atleta, numa primeira fase, seria “contratado” pelo Burgos, para dias depois, ser inscrito pelo Levante! Finalmente, com a época de 1997/98 a decorrer, o estranho périplo terminou e o defesa veio a parar ao Benfica.
Trapalhadas à parte, o regresso de Paulo Madeira à Luz apanhou o clube numa das mais tristes fases da sua história. Esse "arrastar pela lama" trouxe consequências para todos os que nele foram apanhados. O defesa não foi excepção. Injustamente apontado como medíocre, o atleta pagou a factura de um clube em decadência. É certo que não era o mais rápido dos centrais; é certo, também, que não era um dos mais virtuosos da equipa. Contudo, apelidarem de "mau" alguém que, pouco tempo antes, tinha feito parte da convocatória de António Oliveira para a Fase Final do Europeu de 1996 ou porem em causa o valor de um jogador que alcançou as 24 internacionalizações, transformou-se numa tremenda injustiça. Está bem, podemos justificar a atitude dos adeptos pelo momento conturbado vivido pelo emblema. Contudo, há uma coisa que ninguém deve duvidar. Isso é a paixão que Paulo Madeira sempre nutriu pelo clube. A prová-lo estão as horas que dizem ter passado na fila de espera para conseguir votar numa das mais concorridas eleições do Benfica, acto esse que ditaria a derrota do Presidente já aqui aludido, elegendo para o seu lugar Manuel Vilarinho.
Depois do termo da ligação ao Benfica, Paulo Madeira ainda conseguiu outras aventuras no futebol. Já com a carreira a aproximar-se do fim, o defesa-central teve uma fugaz ligação ao Fluminense e outra experiência no plantel de 2003/04 do Estrela da Amadora. Aliás, foi na colectividade sediada na Reboleira que o jogador veio a terminar a caminhada enquanto futebolista.

443 - MORGADO

Hão-de sempre ser equacionadas perguntas sobre as razões de determinadas carreiras. No entanto, há algumas caminhadas que sublinham, muito mais do que quaisquer outras, a necessidade desse tipo de questão. A carreira de Morgado entra nessa categoria!
Com os últimos anos da formação feitos nas Antas, Morgado transformou-se num valor quase seguro, numa promessa ou, se preferirem, no futuro do futebol português. A prova de tal estatuto vinha da sua presença nos mais importantes certames, organizados para as camadas jovens. Assim sendo, já estava cedido à equipa principal do Gil Vicente, à altura a militar na divisão de Honra, quando a convocatória a chamá-lo para o grupo de atletas a representar Portugal no Mundial sub-20 de 1989, surgiu, num caminho direccionado para o sucesso, como uma mera formalidade. Na Arábia Saudita tudo correu normalmente, como exemplar foi o novo empréstimo. Após regressar da campanha de 1989/90 ao serviço do Feirense, emblema que tinha representado até ao escalão de juvenis, a sua inclusão no plantel sénior do FC Porto demonstrou o que tenho estado a tentar sublinhar, ou seja, que o defesa era visto como uma aposta certa. Contudo, ao invés da existência projectada para o lateral-esquerdo, a sua afirmação de "Dragão" ao peito, pareceu querer adiar-se a cada oportunidade recebida. É certo que nomes como os de Branco ou de Vlk, respectivamente internacionais pelo Brasil e pela Checoslováquia, não deram grande espaço ao jovem craque. Ainda assim, o mais estranho no meio de tudo não é a concorrência dentro do balneário “azul e branco”, mas o facto de Morgado ser mesmo um craque e, com tal sentença, só posso afirmar que, no que toca à sua afirmação no “onze” portista, nunca entendi a justiça do falhanço.
Não foram complacentes os responsáveis do FC Porto que, em 1992/93, encaminharam o defesa na direcção de Vila do Conde. No Rio Ave, ainda que de volta ao segundo escalão nacional, as suas prestações começaram a fazer recordar um tal Morgado que, no longínquo Médio Oriente, tinha ajudado a erguer o troféu de campeão do mundo. Todavia, mais uma vez, o regresso ao patamar máximo, com a responsabilidade e exigência que tal acarreta, mostrou um jogador intermitente e incapaz de segurar, em definitivo, um lugar no alinhamento inicial. Foi assim no plantel do Famalicão de 1993/94, no Beira-Mar de 1994/95 e só não continuou por aí em diante, porque a descida dos aveirenses voltou a mostrar o jogador, que muitos esperavam na 1ª divisão, a exibir-se no contexto secundário.
Morgado ainda voltou ao universo dos “grandes" e, finalmente, com os números a apontar-lhe o trilho do sucesso. Porém, mesmo com a sua contribuição para os objectivos de 1998/99 do Desportivo de Chaves a ser aferida como positiva, a prestação colectiva, aquela que realmente interessa nos desportos colectivos, levou-o, com a equipa flaviense, a ser despromovido. Com a aludida descida, veio também o seu ocaso. Desse modo, após representar o emblema transmontano, o defesa-esquerdo, surpreendentemente, só veio a encontrar colocação na 2ª divisão B e vestiu, na época de 1999/00, a camisola do União da Madeira, seguindo-se, nos anos vindouros, mas já na divisão de Honra, as cores do Leça e as do Felgueiras.
O final da sua carreira ficou marcado pela falta de fulgor. Ainda assim, aquilo que retiro desta pequena história, que é apenas a conclusão de um mero adepto da modalidade, é que Morgado passou ao lado de uma grande vida como profissional de futebol. A razão? Mais uma vez, para mim, é um grande mistério!

442 - BIZARRO


Por altura do Mundial sub-20 disputado na Arábia Saudita, Bizarro, com anterior passagem pelo Leixões e pelo FC Porto,  era um dos frutos das escolas benfiquistas. No entanto, como com tantas outras promessas saídas da formação dos clubes portugueses, as oportunidades para o jovem guarda-redes escassearam. É certo que, em 1988/89, a baliza do Benfica estava à guarda de Silvino e de Manuel Bento e que, em certa medida, esse cenário até justifica o seu insucesso para as bandas da Luz. Mas daí a ter tido, apenas, a chance de ocupar o banco de suplentes, também parece, acho que todos concordamos, muito pouco.
Especulações à parte, Bizarro conseguiu uma carreira bem sustentada. É certo, dirão muito dos que estão a ler este texto, nunca foi um guarda-redes exuberante, daqueles que dá nas vistas pelas defesas estonteantes e humanamente designadas como impossíveis. Bizarro era, acima de tudo, um guardião seguro e de quem os seus colegas de equipa podiam depositar bastante confiança. Com isto pergunto-vos: não é isso o exigido a alguém da sua posição?! Adiante…
Durante todo o torneio referido no parágrafo inicial, Bizarro só sofreu 3 golos. Contudo, muito para além desse feito, da titularidade conseguida no Mundial da Arábia Saudita, ou do título aí conquistado, foi a segurança que demonstrou entre os postes a levar o Marítimo, no começo da temporada de 1992/93, a contratá-lo. Chegava assim, à divisão maior do Campeonato Nacional e depois de passagens pelo Louletano e pela Ovarense, o guarda-redes a ostentar o título de campeão do mundo de sub-20 e cujo prestígio daí retirado, ao contrário do que possam pensar, não foi suficiente para entregar ao atleta um lugar no “onze”. Esse estava a cargo de Ewerton e, incrivelmente, durante a sua experiência de 5 anos no Funchal, não pode dizer-se que Bizarro tenha, incontestavelmente, usufruído do estatuto de titular. Aliás, só durante a sua estadia em Espanha, nomeadamente quando representou o plantel de 1997/98 e 1998/99 do Ourense, é que foi o dono absoluto da baliza.
Em 2000/01, depois de também ter envergado as cores do Leganés, Bizarro voltou, em definitivo, ao nosso país e mais concretamente a Vila do Conde. O espantoso de tal regresso é que, por essa altura, as portas da 1ª divisão pareciam estar fechadas para ele. Má aposta na escolha do clube? Outra razão qualquer? Não sei! A verdade é que Bizarro, com 30 anos e, como ditam as regras, no auge da vida profissional, não voltou, até ao fim da sua caminhada como futebolista, a calçar as luvas no patamar máximo do futebol português. De seguida, após representar o Rio Ave, o Leixões e o Maia, e de, na cidade dos subúrbios do Porto, em 2004/05, ter posto um ponto final na carreira, em 2006 decidiu enveredar pela vida de treinador-principal. Nessas funções tem militado, essencialmente, nos escalões inferiores, onde, nesta época de 2013/14, assumiu o controlo do Coimbrões.

441 - CARLOS QUEIROZ

Para Carlos Queiroz, à imagem de tantos outros portugueses, também houve um antes e um pós 25 de Abril. Sem querer entrar no caminho das discussões ideológicas, sociológicas ou de entrar noutro campo qualquer que não o da bola, atrevo-me a dizer que para o jovem Carlos, a “Revolução dos Cravos” só veio trazer-lhe coisas boas.
Bem longe de Lisboa, em Moçambique, ainda jogou à baliza do Ferroviário da sua terra natal, Nampula. No entanto, seria com a vinda para Portugal e com a entrada para o Instituto Superior de Educação Física que a sua vida, verdadeiramente, ficou alinhada com o futebol. Concluída a formação académica e dono do, tão grato, título de "Professor", Carlos Queiroz haveria de ter a primeira experiência como técnico, numa equipa sénior, ao serviço do Estoril-Praia. Porém, apesar de estar sob a alçada de Mário Wilson e de, como adjunto, ganhar o traquejo necessário para alavancar a carreira, o seu destino estava talhado para orientar as jovens promessas do futebol luso e nessa senda, onde tinha passagens pelas “escolas” de alguns clubes, acabou, em 1987, convidado a integrar os quadros da Federação Portuguesa de Futebol.
Não foi necessário muito tempo até que a sua metódica maneira de compreender o futebol começasse a dar frutos. Em Fevereiro de 1989, Portugal, na Arábia Saudita, dava os primeiros passos para a conquista do Mundial sub-20. Por certo, poucos esperaram tamanho sucesso; poucos esperaram que, num contexto com selecções como o Brasil, a Alemanha ou Argentina, os desconhecidos jovens portugueses conseguissem afirmar-se como os melhores. Tão poucos eram os que acreditavam que nem mesmo Carlos Queiroz, já depois do troféu ganho, tomou consciência do feito – "Só começamos a perceber a verdadeira dimensão daquilo quando aterrámos em Lisboa. Ninguém estava à espera daquela recepção, daquela espontaneidade, daquela dimensão"*.
Apesar da pressão que estava sobre a sua cabeça, Carlos Queiroz não vacilou. Continuou a comandar os jovens "lusos" no caminho do sucesso e em Maio de 1989 venceu o Europeu sub-16. Já após outra enorme conquista, a do Mundial sub-20 de 1991, disputado em Portugal, o treinador deve ter achado que era tempo de conseguir afirmar-se no universo dos seniores. O convite que surgiu foi fácil de aceitar. De alguma forma dava continuidade ao trabalho que vinha a fazer e com naturalidade aceitou o convite para dirigir a selecção principal. Contudo, os sucessos a que nos vinha habituando, acabaram por não ter seguimento e Portugal falhou tanto o apuramento para o Euro 92, como para o Mundial de 1994, nos Estados Unidos da América.
O passo seguinte e o único, até aos dias de hoje, à frente de um primodivisionário em Portugal, deu-o em Alvalade. Depois de, bem ao seu estilo e com uma declaração polémica – "É preciso varrer a porcaria que há na federação portuguesa"** – ter abandonado o cargo de seleccionador, conseguiu pelo Sporting, apesar de nunca erguer o tão almejado troféu de campeão nacional, o que há muito não se via por aquelas bandas, ou seja, títulos. Nesse contexto, venceu a Taça de Portugal de 1994/95, a Supertaça do ano seguinte e seria laureado com 2 Prémios Stromp. Ainda assim, tais êxitos não foram suficientes para convencer a direcção "Verde e Branca" que era ele o homem certo para o lugar de timoneiro, acabando por ser despedido pelo Presidente Pedro Santana Lopes.
O episódio de saída de Alvalade marcou o começo do que tem sido a identidade da sua carreia, ou seja, um verdadeiro périplo pelo mundo fora. Esteve nos norte-americanos dos MetroStars, foi até ao Japão para comandar os Nagoya Grampus, passou pela selecção dos Emiratos Árabes Unidos e chegou até ao leme dos "Bafana Bafana". Na África do Sul voltou aos sucessos. Começou por conseguir o apuramento da equipa nacional para o Mundial de 2002. Todavia, quando tudo estava a conjugar-se para que fizesse a estreia em tão importante certame, desencadeou-se um nova polémica entre o treinador e os dirigentes da federação e Carlos Queiroz viu-se afastado da Fase Final do torneio disputado entre a Coreia do Sul e o Japão.
Ainda assim, há males que vêm por bem e o seu afastamento abriu-lhe as portas de um dos maiores emblemas da Europa. No Manchester United, como adjunto de Sir Alex Ferguson, Carlos Queiroz viu a sua reputação a subir em flecha. Foi tão bom o acréscimo de fama que, passado um ano sobre a sua chegada a Inglaterra, surgiu o Real Madrid. Tal presente, de boa parecença, estava, no entanto, (meio) envenenado. Se bem recordam, em 2003/04 vivia-se na capital espanhola o auge da era dos "Galácticos". Pelos "Merengues" alinhavam jogadores como Figo, Ronaldo, Beckham, Casillas, Raul, etc. Claro que, no meio de tantas estrelas, o choque de egos foi enorme. Incapaz de gerir tamanhos caprichos e, ainda assim com uma Supertaça vencida, o seu reinado na capital espanhola foi bem pequeno.
De volta a Old Trafford, por lá ficou durante quatro temporadas. Conquistou tudo o que havia para conquistar, mas aquilo que Queiroz mais queria, a promessa de suceder a Sir Alex Ferguson, nunca veio a concretizar-se. Talvez, farto de estar à espera, abraçou o regresso a Portugal e agarrou-se aos comandos da "Equipa das Quinas". Na ressaca da era Scolari, o treinador ainda conseguiu a qualificação para o Mundial de 2010. Já na África do Sul, com uma equipa considerada das mais fracas dos últimos anos, ainda assim, atingiu os oitavos-de-final. Porém, mais uma vez, as polémica começaram a pairar. A primeira celeuma começou por envolver o seleccionador e uma equipa da Autoridade Antidopagem de Portugal, ainda no contexto do estágio de preparação e sublinhada por uma acesa troca de insultos. Nova controvérsia
A querela, dessa feita, começou por envolver o seleccionador e uma equipa da Autoridade Antidopagem de Portugal. A contenda, ainda no contexto do estágio de preparação e sublinhada por uma acesa troca de insultos, veio a alastrar-se, muito à custa do parco resultado conseguido no Campeonato do Mundo, a jogadores e aos dirigentes federativos. Todos, como ao jeito de arranjar um bode expiatório, pareciam estar contra Carlos Queiroz. Como é óbvio, o treinador acabou afastado do cargo e, pior ainda, entraria numa disputa judicial por razão da suspensão aplicada pela, já referida, entidade de antidopagem.
Já depois de tudo isto, o técnico assumiu funções na selecção do Irão. Mais uma vez, contra todas as probabilidades, qualificou a selecção do Médio Oriente para o Campeonato do Mundo de 2014. No entanto, há coisas que nunca mudam e Carlos Queiroz voltou a envolver-se numa troca de palavras com os responsáveis directivos, tudo por causa da duração do estágio de preparação para o torneio disputado no Brasil.

*retirado da entrevista conduzida por João Bonzinho, publicada em Janeiro de 2007, na revista “A Bola – a fantástica viagem da geração de ouro”.
**retirado do artigo de Ricardo Gouveia, publicado a 19/11/2009, em https://maisfutebol.iol.pt

RIADE '89

A 17 de Fevereiro de 1989, em Riade, começava a caminhada da selecção portuguesa, para aquele que seria um dos episódios mais bonitos do futebol nacional. Passo a passo, esse grupo de jovens surpreendeu o mundo com os seus resultados e exibições. Queremos, neste mês, comemorar o 25º aniversário desse trajecto que acabaria com a conquista do título mundial de sub-20 e, acima de tudo, com a confirmação do aparecimento de uma "geração de ouro".